Quem foi Lampião (cangaceiro): história resumida

Lucas Pereira
Lucas Pereira
Professor de História

Virgulino Ferreira da Silva, mais conhecido pelo apelido Lampião, foi o mais importante cangaceiro da história do Brasil. Nascido no dia 07 de julho de 1897 em Vila Bela, hoje Serra Talhada (PE), tornou-se uma figura temida e admirada no Sertão Nordestino, liderando por décadas um lendário grupo de cangaceiros.

Nascido na fazenda de seu pai, Lampião foi alfabetizado por um professor particular. Sua família tinha propriedades modestas, sem desfrutar do mesmo prestígio das elites locais.

Na juventude, Lampião cuidava dos animais da fazenda e demonstrava habilidade na produção de itens de couro. Nos momentos de lazer, participava de vaquejadas e tocava sanfona, um instrumento popular no Sertão. Segundo a versão mais aceita, seu apelido surgiu devido à sua habilidade ao disparar armas de fogo: disparava tão rapidamente que a arma parecia ter luz própria.

Sua aproximação com o cangaço aconteceu ainda em 1916, quando Lampião se envolveu em conflitos com a família de José Saturnino, dono de uma fazenda vizinha à de seu pai. Ambas as famílias eram inimigas e frequentemente se acusavam de roubos e ofensas.

Para evitar conflitos, José Ferreira, pai de Lampião, vendeu a propriedade, mudando-se eventualmente para Água Branca (AL). No entanto, as tensões com os antigos inimigos persistiram, e Lampião passou a se aproximar do cangaço em busca de proteção e vingança.

O ingresso definitivo no cangaço ocorreu em maio de 1921, após o assassinato de seu pai pela polícia. A partir de então, Lampião e seus irmãos, Antônio e Levino, juraram lutar até a morte em busca de vingança e para honrar o nome da família.

A história de Lampião

Os irmãos Ferreira inicialmente se uniram a grupos de outros cangaceiros, como Antônio Porcino e Sebastião “Sinhô” Pereira. Já em 1922, Lampião assumiu o comando de seu próprio bando.

Líder nato, ele aprendeu rapidamente as estratégias de sobrevivência no período em que atuou sob o comando de Sebastião Pereira. Nessa fase, Lampião também aproveitou para estabelecer contatos com pessoas influentes no Sertão. Desde cedo, compreendeu que a polícia e as elites locais poderiam até ser potenciais aliadas - principalmente por favores e subornos.

A primeira grande ação do bando sob o comando de Lampião ocorreu em 26 de junho de 1922, na cidade de Água Branca (AL). Na ocasião, Lampião e cerca de cinquenta homens realizaram um assalto à casa da Baronesa de Água Branca, uma senhora rica e ligada à nobreza da época monárquica.

Além do interesse financeiro, a escolha do alvo também foi motivada por vingança, uma vez que essa família tinha fortes laços com as autoridades policiais. O sucesso da ação recebeu grande atenção dos jornais da época, sendo Lampião descrito como um dos piores criminosos de Alagoas.

Relacionamento entre Lampião e Maria Bonita

Um dos aspectos mais marcantes na história de Lampião é seu envolvimento com Maria Bonita. Antes conhecida por Maria da Déa, ela nasceu na região de Jeremoabo, Bahia, e vivia na cidade Santa Brígida após o casamento com um de seus primos. Contudo, levava um relacionamento infeliz com o marido, motivando-a a fazer visitas frequentes à fazenda dos pais.

Em 1929, durante uma dessas visitas a Jeremoabo, Maria da Déa encontrou Lampião, por quem já nutria grande admiração. Ambos se apaixonaram à primeira vista, levando Maria Bonita, com o consentimento de sua mãe, a acompanhar Lampião nas ações do cangaço.

Cordel retratando Lampião e Maria Bonita
Cordel retratando Lampião e Maria Bonita

Ela foi a primeira cangaceira da história com permissão para acompanhar o restante do bando. E, a partir desse momento, Lampião passou a permitir que seus seguidores também tivessem companheiras nas viagens. Entretanto, as mulheres não eram tratadas de maneira igualitária: deveriam total respeito aos companheiros, que detinham a última palavra nas decisões. Traições não eram toleradas, visto que poderiam dividir o bando.

Maria Bonita e Lampião permaneceram juntos até a morte de ambos na emboscada em Angicos, em 1938. Mas, seis anos antes desse acontecimento, tiveram uma filha chamada Expedita Ferreira. Dada a dificuldade de criar uma criança na rotina do cangaço, a criança foi entregue a um coiteiro (pessoa conhecida por dar abrigo a bandidos) em Sergipe. Este recebeu a instrução de cuidar da criança até que ela atingisse a idade escolar, mantendo total segredo sobre sua origem.

O bando de Lampião

O bando de Lampião era composto principalmente de sertanejos em fuga da miséria do sertão. Nessa região, a violência era frequentemente vista como o único meio de recuperar a honra da família ou buscar justiça. Assim, seja por questões financeiras ou para buscar tais objetivos, muitos homens aderiam ao cangaço.

Em geral, Lampião realizava ações que incluíam roubos a vilarejos e fazendas, assassinatos e sequestros. Esses crimes provocavam medo na população sertaneja devido às notícias de brutalidade e violência dos cangaceiros.

Por outro lado, sua atuação fora das normas e os confrontos com figuras poderosas do Sertão também o tornava uma figura admirada. Nesse sentido, algumas atitudes de Lampião, como a doação para a construção de uma igreja em Juazeiro, contribuíram para o lado positivo de sua imagem.

Entre 1920 e 1930, Lampião e seu bando atuaram em vários estados nordestinos, como Alagoas, Ceará, Bahia, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Especialmente nos primeiros anos, escolhiam seus alvos com alguma lógica, preferindo antigos inimigos. Por exemplo, em 1922, na cidade de Belmonte (BA), atacaram o Coronel Luiz Gonzaga de Sousa Ferraz, um desafeto do cangaceiro Sebastião Pereira, o que permitiu a Lampião saquear suas propriedades.

Em relação às elites locais, a atitude de Lampião variava entre abordagens pacíficas e confrontos para realizar saques e pilhagens. Ocasionalmente recebiam auxílio e proteção de coronéis em troca de favores e contratação de seus serviços. Portanto, o cangaço operava dentro das contradições e rivalidades dos coronéis, agindo conforme fosse mais conveniente para o bando.

Morte de Lampião e Maria Bonita

No ano de 1938, o bando de Lampião estava pouco ativo. Nos últimos meses da vida, seu nome foi pouco divulgado nos jornais, ofuscado pelas ações de outros grupos. Chegaram mesmo a ser considerados mortos, mas, em abril daquele ano, realizaram ataques e voltaram a ser noticiados.

Em seguida, Lampião se abrigou numa modesta fazenda na região de Angicos, Sergipe. No entanto, Joca Bernardes, coiteiro conhecido de Lampião, decidiu delatar à polícia sobre a presença do cangaceiro naquele local.

Sob o comando do tenente João Bezerra, um destacamento policial surpreendeu o esconderijo em 28 de julho de 1938. O ataque durou apenas vinte minutos, resultando na morte de onze cangaceiros, incluindo Lampião e Maria Bonita. Ao fim da batalha, os soldados saquearam e decapitaram os corpos, levando as cabeças dos cangaceiros para exposição pública.

Quanto ao Cangaço, a expectativa era de que outros grupos assumissem a liderança deixada por Virgulino, com destaque para Corisco, cangaceiro muito famoso à época. No entanto, o cangaço continuou a ser perseguido pelas autoridades e enfraqueceu progressivamente, deixando de existir ainda em 1940.

O que foi o Cangaço

Cangaço é o nome dado a grupos de bandidos que atuaram no Sertão nordestino entre 1870 e 1940. Diferente dos jagunços, que eram grupos armados contratados por fazendeiros para proteger famílias e propriedades, os cangaceiros eram bandos armados que buscavam seus próprios interesses.

O surgimento do cangaço se explica pelas condições sociais, políticas e econômicas do Sertão Nordestino à época. Era uma região marcada pela concentração de terras, por secas periódicas e certo isolamento regional. Assim, grande parte da população sertaneja vivia em condições precárias e dependia dos coronéis para sobreviver.

Para agravar, o Estado era praticamente inexistente no sertão, sem oferecimento de serviços básicos adequados como educação e segurança. A polícia local, corrupta e violenta, estava ligada aos interesses da elite, minando a confiança da população sertaneja na instituição para resolver seus problemas e disputas.

Diante da miséria, falta de oportunidades e ausência de um Estado eficaz, muitos jovens sertanejos viam no cangaço uma alternativa para melhorar suas vidas. Além disso, buscavam nos bandos cangaceiros uma forma de buscar justiça e vingança pelos familiares mortos, muitas vezes vítimas da violência vigente na região.

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Referências Bibliográficas

CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião, o rei dos cangaceiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

NEGREIROS, Adriana. Maria Bonita, sexo, violência e mulheres no Cangaço. São Paulo: Objetiva, 2018

SCHWARCZ, Lilia Moritz e STARLING, Heloisa Maria Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

Lucas Pereira
Lucas Pereira
Bacharel e Licenciado em História pela Universidade Estadual de Campinas (2013), com mestrado em Ensino de História pela mesma instituição (2020). Atua como professor de História na educação básica e em cursos pré-vestibulares desde 2013. Desde 2016, também desenvolve conteúdos educativos na área de História.