O Quinze
O Quinze é o primeiro romance da escritora modernista Rachel de Queiroz. Publicada em 1930, a obra regionalista e social apresenta como tema central a seca de 1915 que assolou o nordeste do país.
Rachel de Queiroz (1910-2003) foi a primeira mulher a entrar para a Academia Brasileira de Letras. Era cearense e ainda criança mudou-se com a família para o Rio de Janeiro para fugir da seca.
Resumo da obra O Quinze
Chico Bento vivia com sua esposa Cordulina e seus três filhos na fazenda de Dona Maroca, em Quixadá. Ele era vaqueiro e o sustento vinha da terra.
No entanto, com o problema da seca que cada vez mais assolava a região onde viviam, ele e sua família são obrigados a migrar para a capital do Ceará, Fortaleza.
Desempregado e em busca de condições mais dignas, ele e sua família vão a pé de Quixadá a Fortaleza, pois não tinham o dinheiro da passagem. Grande parte da obra relata as dificuldades, desde a fome e a sede, que passaram durante o trajeto.
Numa das passagens, ele e sua família encontram outro grupo de retirantes saciando a fome com a carcaça de um gado. Comovido com a cena, ele decide dividir a pouca comida que levavam (rapadura e farinha) com os novos amigos.
Mais adiante, ele mata uma cabra, no entanto, o dono do animal fica enfurecido. Mesmo ouvindo a história triste de Chico Bento em busca de alimento para ele e sua família, o dono do animal, deixa somente as vísceras para alimentá-los.
Diante de tanta fome, um dos filhos do casal, Josias, come uma raiz de mandioca cru, o que causa sua morte.
Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova à beira da estrada, com uma cruz de dois paus amarrados, feita pelo pai. Ficou em paz. Não tinha mais que chorar de fome, estrada afora. Não tinha mais alguns anos de miséria à frente da vida, para cair depois no mesmo buraco, à sombra das mesma cruz.
Além disso, o filho mais velho, Pedro, acaba se juntando a outro bando de retirantes e o casal não o vê mais.
Ao chegar em Fortaleza, a família de Chico Bento vai para o "Campo de Concentração", um espaço destinado aos flagelados da seca.
Ali, encontram Conceição, professora e voluntária, que por fim, torna-se madrinha do filho caçula do casal: Manuel, apelidado de Duquinha.
Conceição os ajuda a comprar passagens para São Paulo e como madrinha da criança pede a eles para ficar com o menino, uma vez que o considerava um filho. Embora apresentassem resistência, Duquinha acabou ficando no Ceará com sua madrinha.
Conceição era prima de Vicente, um proprietário e criador de gado muito mesquinho. Ela se sentia atraída por ele, no entanto, o rapaz conhece Mariinha Garcia, uma moradora de Quixadá e que também estava interessada em Vicente. Num tom de consolo, sua avó diz:
Minha filha, a vida é assim mesmo... Desde hoje que o mundo é mundo... Eu até acho os homens de hoje melhores.
Com a chegada da chuva e consequentemente da esperança para o povo nordestino, a avó de Conceição resolve voltar a sua terra natal, Logradouro, mas a garota decide ficar em Fortaleza.
Personagens da obra O Quinze
A obra é composta de 26 capítulos sem títulos. Os personagens que compõem a trama são:
- Chico Bento: vaqueiro
- Cordulina: mulher de Chico Bento
- Mocinha: Irmã de Cordulina, cunhada de Chico Bento
- Luís Bezerra: compadre de Chico Bento e Cordulina
- Doninha: esposa de Luís Bezerra, madrinha do Josias
- Josias: filho de Chico Bento e Cordulina
- Pedro: filho mais velho de Chico Bento e Cordulina
- Manuel (Duquinha): filho caçula de Chico Bento e Cordulina
- Vicente: proprietário e criador de gado
- Paulo: irmão mais velho de Vicente
- Lourdinha: irmã mais velha de Vicente
- Alice: irmã mais nova de Vicente
- Dona Idalina: prima de Dona Inácia e a mãe de Vicente, Paulo, Alice e Lourdinha
- Conceição: professora prima de Vicente
- Mãe Nácia (Dona Inácia): avó de Conceição
- Mariinha Garcia: moradora de Quixadá, interessada em Vicente
- Chiquinha Boa: trabalhava na fazenda de Vicente
- Major: fazendeiro rico da região de Quixadá
- Dona Maroca: fazendeira e dona da fazenda Aroeiras, na região de Quixadá
- Zefinha: filha do vaqueiro Zé Bernardo
Análise obra O Quinze
Com o enfoque na região nordestina, a obra O Quinze possui um caráter regionalista.
Numa narrativa linear, Rachel retrata a realidade dos retirantes nordestinos quando essa região foi atingida por uma grande seca em 1915.
Assim, o romance contém um forte teor social, que além de enfocar na realidade das pessoas do local, retrata a fome e a miséria.
A análise psicológica das personagens e o uso do discurso direto, revelam as dificuldades e os pensamentos do ser humano ante os problemas sociais que são desencadeados pela seca.
Numa linguagem simples e coloquial, o romance é marcado, sobretudo, por frases curtas, breves e precisas. A prosa é narrada em terceira pessoa, com a presença de um narrador onisciente.
Trechos da obra O Quinze
Para compreender melhor a linguagem utilizada pela escritora, confira abaixo alguns trechos da obra:
Depois de se benzer e de beijar duas vezes a medalhinha de São José, Dona Inácia concluiu: ”Dignai-vos ouvir nossas súplicas, ó castíssimo esposo da Virgem Maria, e alcançai o que rogamos. Amém.” Vendo a avó sair do quarto do santuário, Conceição, que fazia as tranças sentada numa rede ao canto da sala, interpelou-a: - E isto chove, hein, Mãe Nácia? Já chegou o fim do mês... Nem por você fazer tanta novena...
Agora, ao Chico Bento, como único recurso, só restava arribar. Sem legume, sem serviço, sem meios de nenhuma espécie, não havia de ficar morrendo de fome, enquanto a seca durasse. Depois, o mundo é grande e no Amazonas sempre há borracha... Alta noite, na camarinha fechada que uma lamparina moribunda alumiava mal, combinou com a mulher o plano de partida. Ela ouvia chorando, enxugando na varanda encarnada da rede, os olhos cegos de lágrimas. Chico Bento, na confiança do seu sonho, procurou animá-la, contando-lhe os mil casos de retirantes enriquecidos no Norte.
No dia seguinte, de madrugada bem cedo, Vicente, no seu cavalo pedrês, galopava na estrada. De longe ainda apareceu-lhe a casa do Logradouro, erguida no seu alto. As janelas verdes, cerradas, o alpendre vazio, o curral, com a poeira seca do estrume meio varrida pelo vento. Defronte à janela do quarto de Conceição, uma forquilha onde sempre havia uma panela de barro com um craveiro, se espetava sozinha, sem planta e sem panela, estendendo para o ar os três braços vazios. E na frente do alpendre, um gato faminto, esguio como uma cobra, miava lamentosamente.
Tudo isso era vagaroso, e ainda tinham que sofrer vários meses de fome. À medida que a cadeirinha avançava, Dona Inácia informava-se com o vaqueiro sobre o que sucedera pelo Logradouro. O homem só aludia a misérias e a mortes. Dos olhos embaciados da velha, as lágrimas desciam, apressadas. E ao ver a sua casa, o curral vazio, o chiqueiro da criação devastado e em silêncio, a vida morta, apesar do lençol verde que tudo cobria, Dona Inácia amargamente chorou, com a mesma desesperada aflição de quem encontra o corpo de alguém muito querido, que durante nossa ausência morreu.
O povo se apinhava na avenida, o dinheiro circulava alegremente, as lâmpadas de carbureto espargiam sobre o burburinho focos de luz muito branca, que tornava baça e triste a cara afilada da lua crescente. Num grupo, a um recanto iluminado, Conceição, Lourdinha e o marido, Vicente e o novo dentista da terra - um moço gordo, roliço, de costeletas crespas e o pince-nez sempre mal seguro no nariz redondo - conversavam animadamente.
Filme O Quinze
O filme O Quinze é baseado na obra de Rachel de Queiroz. O drama foi lançado em 2004 e dirigido por Jurandir de Oliveira.
Leia também:
Vida e Obra de Rachel de Queiroz
Vidas Secas de Graciliano Ramos
FERNANDES, Márcia. O Quinze. Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/o-quinze/. Acesso em: