Questões de Filosofia do Enem

Pedro Menezes
Pedro Menezes
Professor de Filosofia, Mestre em Ciências da Educação

A Filosofia é uma parte importante da área de Ciências Humanas e suas Tecnologias do Enem.

O bom resultado dos participantes depende do domínio de alguns temas centrais da disciplina como ética, política, teoria do conhecimento e metafísica.

Questão 1

(Enem/2012) TEXTO I

Anaxímenes de Mileto disse que o ar é o elemento originário de tudo o que existe, existiu e existirá, e que outras coisas provêm de sua descendência. Quando o ar se dilata, transforma-se em fogo, ao passo que os ventos são ar condensado. As nuvens formam-se a partir do ar por feltragem e, ainda mais condensadas, transformam-se em água. A água, quando mais condensada, transforma-se em terra, e quando condensada ao máximo possível, transforma-se em pedras.

BURNET, J. A aurora da filosofia grega. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2006 (adaptado).

TEXTO II

Basílio Magno, filósofo medieval, escreveu: “Deus, como criador de todas as coisas, está no princípio do mundo e dos tempos. Quão parcas de conteúdo se nos apresentam, em face desta concepção, as especulações contraditórias dos filósofos, para os quais o mundo se origina, ou de algum dos quatro elementos, como ensinam os Jônios, ou dos átomos, como julga Demócrito. Na verdade, dão impressão de quererem ancorar o mundo numa teia de aranha.”

GILSON, E.: BOEHNER, P. Historia da Filosofia Crista. São Paulo: Vozes, 1991 (adaptado).

Filósofos dos diversos tempos históricos desenvolveram teses para explicar a origem do universo, a partir de uma explicação racional. As teses de Anaxímenes, filósofo grego antigo, e de Basílio, filósofo medieval, têm em comum na sua fundamentação teorias que

a) eram baseadas nas ciências da natureza.
b) refutavam as teorias de filósofos da religião.
c) tinham origem nos mitos das civilizações antigas.
d) postulavam um princípio originário para o mundo.
e) defendiam que Deus é o princípio de todas as coisas.

Alternativa correta: d) postulavam um princípio originário para o mundo.

A pergunta sobre a origem de todas as coisas é uma questão que moveu a filosofia desde seu nascimento na Grécia antiga.

Na tentativa de abandono do pensamento mítico fundamentado em imagens e fabulações, buscou-se uma explicação lógica e racional para o princípio originário do mundo.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) O pensamento grego busca a compreensão da natureza para explicar a origem do mundo. Entretanto, o princípio estabelecido por Basílio Magno é fundamentado na ideia de Deus.

b) O filósofo Basílio Magno era teólogo e um filósofo da religião.

c) O pensamento filosófico nasce da refutação (recusa, negação) dos mitos.

e) Apenas Basílio Magno defende que Deus é o princípio de todas as coisas. Para Anaxímenes, o elemento primordial (arché) gerador de tudo o que existe é o Ar.

Questão 2

(Enem/2017) Uma conversação de tal natureza transforma o ouvinte; o contato de Sócrates paralisa e embaraça; leva a refletir sobre si mesmo, a imprimir à atenção uma direção incomum: os temperamentais, como Alcibíades sabem que encontrarão junto dele todo o bem de que são capazes, mas fogem porque receiam essa influência poderosa, que os leva a se censurarem. Sobretudo a esses jovens, muitos quase crianças, que ele tenta imprimir sua orientação.

BREHIER, E. História da filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1977.

O texto evidencia características do modo de vida socrático, que se baseava na

a) Contemplação da tradição mítica.
b) Sustentação do método dialético.
c) Relativização do saber verdadeiro.
d) Valorização da argumentação retórica.
e) Investigação dos fundamentos da natureza.

Alternativa correta: b) Sustentação do método dialético.

Sócrates foi um defensor da ignorância como o princípio básico para o conhecimento. Daí a importância da sua frase "só sei que nada sei". Para ele, é preferível não saber a julgar saber.

Sendo assim, Sócrates construiu um método que, através do diálogo (método dialético), as falsas certezas e os pré-conceitos eram abandonados, o interlocutor assumia a sua ignorância. A partir daí, buscava o conhecimento verdadeiro.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Sócrates busca abandonar os mitos e as opiniões para a construção do conhecimento verdadeiro.

c) Sócrates acreditava que existe um conhecimento verdadeiro e esse pode ser despertado através da razão. Teceu diversas críticas aos sofistas por esses assumirem uma perspetiva de relativização do saber.

d) Os sofistas afirmavam que a verdade é um mero ponto de vista, estando baseada no argumento mais convincente. Para Sócrates, essa posição era contrária à essência do saber verdadeiro, próprio da alma humana.

e) O filósofo dá início ao período antropológico da filosofia grega. As questões relativas à vida humana viram o centro das atenções, deixando de lado a busca sobre os fundamentos da natureza, própria do período pré-socrático.

Questão 3

Para Platão, o que havia de verdadeiro em Parmênides era que o objeto de conhecimento é um objeto de razão e não de sensação, e era preciso estabelecer uma relação entre objeto racional e objeto sensível ou material que privilegiasse o primeiro em detrimento do segundo. Lenta, mas irresistivelmente, a Doutrina das Ideias formava-se em sua mente.
ZINGANO, M. Platão e Aristóteles: o fascínio da filosofia. São Paulo: Odysseus, 2012 (adaptado).

O texto faz referência à relação entre razão e sensação, um aspecto essencial da Doutrina das Ideias de Platão (427 a.C.-346 a.C.). De acordo com o texto, como Platão se situa diante dessa relação?

a) Estabelecendo um abismo intransponível entre as duas.
b) Privilegiando os sentidos e subordinando o conhecimento a eles.
c) Atendo-se à posição de Parmênides de que razão e sensação são inseparáveis.
d) Afirmando que a razão é capaz de gerar conhecimento, mas a sensação não.
e) Rejeitando a posição de Parmênides de que a sensação é superior à razão.

Alternativa correta: d) Afirmando que a razão é capaz de gerar conhecimento, mas a sensação não.

A marca principal da Doutrina ou Teoria das Ideias de Platão é a razão como fonte do conhecimento verdadeiro.

O filósofo divide o mundo em dois:

  • O mundo das ideias ou mundo inteligível - é o mundo verdadeiro, eterno e imutável, onde habitam as ideias, ou seja, a essência das coisas, que só pode ser alcançado através do intelecto (da razão).
  • O mundo dos sentidos ou mundo sensível - é o mundo do erro, do engano, onde as coisas mudam e sofrem a ação do tempo. É o mundo em que vivemos e interagimos com as coisas através de nossos sentidos. Esse mundo é uma imitação do mundo das ideias.

Assim, a razão é capaz de gerar um conhecimento verdadeiro, enquanto os sentidos conduzem ao erro e à mera opinião.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Existe uma ligação entre os mundos platônicos. O mundo dos sentidos é a imitação do mundo das ideias, é como as coisas se apresentam aos nossos sentidos.

b) Para Platão, a razão é privilegiada e não os sentidos, só ela é capaz de alcançar o conhecimento.

c) Tanto para Platão quanto para Parmênides, há uma divisão clara e entre os sentidos e a razão.

e) Parmênides e Platão reforçam a ideia de uma hierarquização, em que a razão é superior aos sentidos.

Questão 4

(Enem/2017) Se, pois, para as coisas que fazemos existe um fim que desejamos por ele mesmo e tudo o mais é desejado no interesse desse fim; evidentemente tal fim será o bem, ou antes, o sumo bem. Mas não terá o conhecimento grande influência sobre essa vida? Se assim é esforcemo-nos por determinar, ainda que em linhas gerais apenas, o que seja ele e de qual das ciências ou faculdades constitui o objeto. Ninguém duvidará de que o seu estudo pertença à arte mais prestigiosa e que mais verdadeiramente se pode chamar a arte mestra. Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é ela que determina quais as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais são as que cada cidadão deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as faculdades tidas em maior apreço, como a estratégia, a economia e a retórica, estão sujeitas a ela. Ora, como a política utiliza as demais ciências e, por outro lado, legisla sobre o que devemos e o que não devemos fazer, a finalidade dessa ciência deve abranger as duas outras, de modo que essa finalidade será o bem humano.

ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. In: Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991 (adaptado)

Para Aristóteles, a relação entre o sumo bem e a organização da pólis pressupõe que

a) O bem dos indivíduos consiste em cada um perseguir seus interesses.
b) O sumo bem é dado pela fé de que os deuses são os portadores da verdade.
c) A política é a ciência que precede todas as demais na organização da cidade.
d) A educação visa formar a consciência de cada pessoa para agir corretamente.
e) A democracia protege as atividades políticas necessárias para o bem comum.

Alternativa correta: c) A política é a ciência que precede todas as demais na organização da cidade.

A questão trabalha com dois conceitos centrais em Aristóteles:

  • O ser humano é um animal político (zoon politikon). Faz parte da natureza humana associar-se e viver em comunidade (pólis) sendo o que nos diferencia dos outros animais.
  • O ser humano naturalmente busca a felicidade. A felicidade é o bem maior e somente por ignorância, por não compreender o bem, é que o ser humano pratica o mal.

Sendo assim, a política é a ciência que precede todas as demais na organização da cidade, por ser a garantia da realização da natureza humana nas relações existentes na pólis e a organização de todos em direção à felicidade.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Para o filósofo, a natureza política dos seres humanos tende à definição dos interesses comuns.

b) Aristóteles afirma que o sumo bem é a felicidade (eudaimonia) e os seres humanos realizam-se através da vida política.

d) A filosofia aristotélica compreende o ser humano como essencialmente bom, não necessitando "formar a consciência para agir corretamente".

e) Aristóteles era um defensor da política, mas não necessariamente da democracia. Para o filósofo, existe uma série de fatores que compõem um bom governo e esses fatores variam de acordo com os contextos, alterando também a melhor forma de governo.

Questão 5

(Enem/2019) De fato, não é porque o homem pode usar a vontade livre para pecar que se deve supor que Deus a concedeu para isso. Há, portanto, uma razão pela qual Deus deu ao homem esta característica, pois sem ela não poderia viver e agir corretamente. Pode-se compreender, então, que ela foi concedida ao homem para esse fim, considerando-se que se um homem a usa para pecar, recairão sobre ele as punições divinas. Ora, isso seria injusto se a vontade livre tivesse sido dada ao homem não apenas para agir corretamente, mas também para pecar. Na verdade, por que deveria ser punido aquele que usasse sua vontade para o fim para o qual ela lhe foi dada?
AGOSTINHO. O livre-arbítrio. In: MARCONDES, D. Textos básicos de ética. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

Nesse texto, o filósofo cristão Agostinho de Hipona sustenta que a punição divina tem como fundamento o(a)

a) desvio da postura celibatária.
b) insuficiência da autonomia moral.
c) afastamento das ações de desapego.
d) distanciamento das práticas de sacrifício.
e) violação dos preceitos do Velho Testamento.

Alternativa correta: b) insuficiência da autonomia moral.

Para Agostinho de Hipona, ou Santo Agostinho, Deus dotou os seres humanos de autonomia, a finalidade dessa dádiva é a possibilidade de agir livremente e em conformidade com Seus ensinamentos, não para pecar.

O pecado é um efeito da capacidade humana de falhar no uso de sua liberdade, fundamentada na insuficiência de sua autonomia moral, devendo assim, prestar contas de seus erros e assumir a possível punição de Deus.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A condição do celibato, não é uma regra para todos os seres humanos. Assim, não fundamenta a punição divina.

c) O afastamento das ações do desapego pode ser compreendido como um desvio, mas não comportam todas as possibilidades de pecado.

d) O sacrifício em Santo Agostinho é compreendido como a união dos humanos com Deus. Assim, as práticas de sacrifício são a doação de si como forma de oferta a Deus, através de seus semelhantes.

O distanciamento dessas práticas poderiam levar os seres humanos a um distanciamento de Deus e a uma possível punição, mas não é o fator principal que a sustenta.

e) A filosofia de Agostinho de Hipona é fundamentada nos preceitos do Novo Testamento e, principalmente, na figura de Cristo.

Assim, a violação dos preceitos do Velho Testamento não fundamentam a punição divina.

Questão 6

(Enem/2013) Nasce daqui uma questão: se vale mais ser amado que temido ou temido que amado. Responde-se que ambas as coisas seriam de desejar; mas porque é difícil juntá-las, é muito mais seguro ser temido que amado, quando haja de faltar uma das duas. Porque dos homens que se pode dizer, duma maneira geral, que são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ávidos de lucro, e enquanto lhes fazes bem são inteiramente teus, oferecem-te o sangue, os bens, a vida e os filhos, quando, como acima disse, o perigo está longe; mas quando ele chega, revoltam-se.

MAQUIAVEL, N. O Príncipe. Rio de Janeiro: Bertrand, 1991.

A partir da análise histórica do comportamento humano em suas relações sociais e políticas, Maquiavel define o homem como um ser

a) munido de virtude, com disposição nata a praticar o bem a si e aos outros.
b) possuidor de fortuna, valendo-se de riquezas para alcançar êxito na política.
c) guiado por interesses, de modo que suas ações são imprevisíveis e inconstantes.
d) naturalmente racional, vivendo em um estado pré-social e portando seus direitos naturais.
e) sociável por natureza, mantendo relações pacíficas com seus pares.

Alternativa correta: c) guiado por interesses, de modo que suas ações são imprevisíveis e inconstantes.

Maquiavel nos mostra em seu livro O Príncipe que a moral e a política não estão sempre relacionadas e que o indivíduo é guiado por interesses, de modo que suas ações são imprevisíveis e inconstantes. E, para o bem de todos, é preferível que um governo seja temido a amado.

Maquiavel chama a atenção para o poder exercido pelos governantes. Em sua perspectiva, quanto mais forte e impiedoso for o poder, mais capaz de garantir a paz e a harmonia será.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) O conceito de virtude (virtù), em Maquiavel, está ligado à possibilidade de escolha (livre-arbítrio) do príncipe. Ou seja, a virtude está relacionada ao governante e não ao homem comum.

b) O conceito de fortuna também se relaciona somente com o príncipe. É sua capacidade de prever e controlar a “roda da fortuna”, o que significa controlar a imprevisibilidade dos efeitos gerados a partir das ações.

d) Essa resposta assemelha-se ao pensamento acerca do estado de natureza proposto pelos filósofos contratualistas.

e) Sociável por natureza, mantendo relações pacíficas com seus pares. Essa concepção remete ao pensamento de Rousseau. O filósofo afirma que o ser humano é naturalmente bom, o “bom selvagem”.

Questão 7

(Enem/2019) Para Maquiavel, quando um homem decide dizer a verdade pondo em risco a própria integridade física, tal resolução diz respeito apenas a sua pessoa. Mas se esse mesmo homem é um chefe de Estado, os critérios pessoais não são mais adequados para decidir sobre ações cujas consequências se tornam tão amplas, já que o prejuízo não será apenas individual, mas coletivo. Nesse caso, conforme as circunstâncias e os fins a serem atingidos, pode-se decidir que o melhor para o bem comum seja mentir.
ARANHA, M. L. Maquiavel: a lógica da força. São Paulo: Moderna, 2006 (adaptado).

O texto aponta uma inovação na teoria política na época moderna expressa na distinção entre

a) idealidade e efetividade da moral.
b) nulidade e preservabilidade da liberdade.
c) ilegalidade e legitimidade do governante.
d) verificabilidade e possibilidade da verdade.
e) objetividade e subjetividade do conhecimento.

Alternativa correta: a) idealidade e efetividade da moral.

A filosofia maquiaveliana é marcada pela forte distinção entre o dever do indivíduo comum e o dever do príncipe (Estado).

Assim, a idealidade da moral, aplicada aos indivíduos comuns, não pode ser aplicada à lógica do governo. A responsabilidade do príncipe é com a governança, sendo assim, está ligada a efetividade de suas ações, ainda que contrariem a moral ideal.

Em outras palavras, a virtú do governante está fundamentada em sua capacidade de se antecipar às imprevisibilidades da história e tomar medidas eficazes, que se distinguem da moral cristã tradicional.

As outras alternativas estão erradas porque:

Nenhuma das outras alternativas apresenta uma distinção relevante no pensamento de Maquiavel.

Questão 8

(Enem/2012) TEXTO I

Experimentei algumas vezes que os sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez.

DESCARTES, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

TEXTO II

Sempre que alimentarmos alguma suspeita de que uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva esta suposta ideia? E se for impossível atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá para confirmar nossa suspeita.

HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento. São Paulo: Unesp, 2004 (adaptado).

Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a natureza do conhecimento humano. A comparação dos excertos permite assumir que Descartes e Hume

a) defendem os sentidos como critério originário para considerar um conhecimento legítimo.
b) entendem que é desnecessário suspeitar do significado de uma ideia na reflexão filosófica e crítica.
c) são legítimos representantes do criticismo quanto à gênese do conhecimento.
d) concordam que conhecimento humano é impossível em relação às ideias e aos sentidos.
e) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento.

Alternativa correta: e) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento.

Descartes e Hume são representantes de correntes de pensamento opostos.

Enquanto, o racionalismo de Descartes propõe que os sentidos são enganosos e não podem servir como base para o conhecimento. O empirismo, que tem em Hume o seu defensor mais radical, afirma que todo conhecimento tem origem na experiência, nos sentidos.

Com isso, podemos dizer que eles atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Descartes e o racionalismo desprezam os sentidos para o conhecimento.

b) O cogito cartesiano (penso, logo existo) nasce da dúvida metódica. Descartes duvida de tudo até encontrar algo seguro para embasar o conhecimento. Sendo assim, a suspeita é uma parte imprescindível para a reflexão filosófica.

c) O criticismo é uma perspectiva kantiana que visa criticar as posições do racionalismo e do empirismo.

d) Apesar de Hume assumir uma posição cética quanto ao conhecimento, para Descartes não existe a ideia de impossibilidade para o conhecimento.

Questão 9

(Enem/2019) TEXTO I
Considero apropriado deter-me algum tempo na contemplação deste Deus todo perfeito, ponderar totalmente à vontade seus maravilhosos atributos, considerar, admirar e adorar a incomparável beleza dessa imensa luz. DESCARTES, R. Meditações. São Paulo: Abril Cultural, 1980.

TEXTO II
Qual será a forma mais razoável de entender como é o mundo? Existirá alguma boa razão para acreditar que o mundo foi criado por uma divindade todo-poderosa? Não podemos dizer que a crença em Deus é “apenas” uma questão de fé. RACHELS, J. Problemas da filosofia. Lisboa: Gradiva, 2009.

Os textos abordam um questionamento da construção da modernidade que defende um modelo

a) centrado na razão humana.
b) baseado na explicação mitológica.
c) fundamentado na ordenação imanentista.
d) focado na legitimação contratualista.
e) configurado na percepção etnocêntrica.

Alternativa correta: a) centrado na razão humana.

A Idade Moderna, ou modernidade, é marcada por uma viragem centrada na razão humana. O pensamento de Descartes, marca essa transição, o ser humano dotado de razão é capaz de conhecer todos os aspectos da criação divina.

No texto II, mostra um avanço da racionalização que coloca em questão as bases para o conhecimento racional.

As outras alternativas estão erradas porque:

b) a explicação mitológica da realidade foi sendo abandonada pelos primeiros filósofos (pré-socráticos), que buscaram um conhecimento baseado no "lógos", dando origem às explicações filosóficas, lógico-racionais.

As alternativas "c", "d", e "e" apresentam pontos decorrentes do pensamento moderno, mas nenhum deles se apresenta como modelo para a construção do pensamento moderno.

Questão 10

(Enem/2019) Dizem que Humboldt, naturalista do século XIX, maravilhado pela geografia, flora e fauna da região sul-americana, via seus habitantes como se fossem mendigos sentados sobre um saco de ouro, referindo-se a suas incomensuráveis riquezas naturais não exploradas. De alguma maneira, o cientista ratificou nosso papel de exportadores de natureza no que seria o mundo depois da colonização ibérica: enxergou-nos como territórios condenados a aproveitar os recursos naturais existentes.
ACOSTA, A. Bem viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos. São Paulo: Elefante, 2016 (adaptado).

A relação entre ser humano e natureza ressaltada no texto refletia a permanência da seguinte corrente filosófica:

a) Relativismo cognitivo.
b) Materialismo dialético.
c) Racionalismo cartesiano.
d) Pluralismo epistemológico.
e) Existencialismo fenomenológico.

Alternativa correta: c) Racionalismo cartesiano.

O racionalismo cartesiano é uma referência ao pensamento do filósofo René Descartes (1596-1650). Para o pensador, a razão é a maior das faculdades humanas e o fundamento de todo o conhecimento válido.

É através da razão que os seres humanos dominam a natureza e a utilizam como meio para o seu desenvolvimento.

Assim, o pensamento de Humboldt, que relaciona a natureza a um "saco de ouro", demonstra uma concepção da natureza a partir de seu aspecto como um produto a ser explorado e comercializado.

A visão da natureza como um meio para a obtenção de riqueza é uma marca da concepção cartesiana de domínio e exploração da natureza pelos seres humanos.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) O relativismo cognitivo é marcado pela possibilidade de diferentes conhecimentos sejam simultaneamente válidos.

No texto não há nenhuma marca de relativização, apenas o reforço da ideia de natureza como produto.

b) O materialismo dialético é uma teoria desenvolvida pelo sociólogo Karl Marx (1818-1883). Segundo Marx, as relações de produção vão determinar a construção social, que avança a partir da exploração de uma classe por outra.

O pensamento de Humboldt expesso no texto não leva em conta esse tipo de relação produtiva.

d) O pluralismo epistemológico é uma corrente de pensamento que defende que os saberes estão diretamente ligados aos diferentes contextos.

No texto, há o reforço de uma visão etnocêntrica/eurocêntrica, que reforça a visão das colônias como uma possibilidade de exploração da natureza.

Também desqualifica a epistemologia (os saberes) dos povos originários das Américas, que não exploram a natureza como os europeus e são vistos como "mendigos sentados sobre um saco de ouro".

e) O existencialismo fenomenológico, influenciado pelo pensamento de Jean-Paul Sartre (1905-1980), busca compreender e respeitar os indivíduos a partir de suas experiências e construção de sua existência.

Assim, o sujeito é construído a partir de relações inter-subjetivas (entre sujeitos), enquanto no texto o indivíduos das Américas são tomados como objetos ("exportadores de natureza").

Questão 11

(Enem/2013) Para que não haja abuso, é preciso organizar as coisas de maneira que o poder seja contido pelo poder. Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as divergências dos indivíduos.

Os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário atuam de forma independente para a efetivação da liberdade, sendo que esta não existe se uma mesma pessoa ou grupo exercer os referidos poderes concomitantemente.

MONTESQUIEU, B. Do Espírito das Leis. São Paulo: Abril Cultural, 1979 (adaptado).

A divisão e a independência entre os poderes são condições necessárias para que possa haver liberdade em um estudo. Isso pode ocorrer apenas sob um modelo político em que haja

a) exercício de tutela sobre atividades jurídicas e políticas.
b) consagração do poder político pela autoridade religiosa.
c) concentração do poder nas mãos de elites técnico-científicas.
d) estabelecimento de limites aos atores públicos e às instituições do governo.
e) reunião das funções de legislar, julgar e executar nas mãos de um governo eleito.

Alternativa correta: d) estabelecimento de limites aos atores públicos e às instituições do governo.

Montesquieu foi um filósofo influenciado pelo pensamento iluminista. Com isso, faz críticas ao absolutismo e à centralização do poder. Foi defensor da ideia da tripartição do poder para que houvesse o estabelecimento de limites aos atores públicos e às instituições do governo a partir da regulação entre os poderes, impedindo a tirania própria do poder centralizado na mão de um governante.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Para o filósofo, algo que interfira na independência de cada um dos poderes incide no risco do autoritarismo gerado pelo acúmulo excessivo de poder.

b) Montesquieu valoriza o poder advindo do povo, independente de uma determinação religiosa.

c) Como dito anteriormente, o filósofo era contra qualquer possibilidade de concentração do poder.

e) Mesmo os governos eleitos democraticamente não podem acumular em si todos os poderes sob o risco de se tornarem tirânicos.

Questão 12

(Enem/2018) Tudo aquilo que é válido para um tempo de guerra, em que todo homem é inimigo de todo homem, é válido também para o tempo durante o qual os homens vivem sem outra segurança senão a que lhes pode ser oferecida por sua própria força e invenção.

HOBBES, T. Leviatã. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

TEXTO II

Não vamos concluir, com Hobbes que, por não ter nenhuma ideia de bondade, o homem seja naturalmente mau. Esse autor deveria dizer que, sendo o estado de natureza aquele em que o cuidado de nossa conservação é menos prejudicial à dos outros, esse estado era, por conseguinte, o mais próprio à paz e o mais conveniente ao gênero humano.

ROUSSEAU, J.-J. Discurso sobre a origem e o fundamento da desigualdade entre os homens. São Paulo: Martins Fontes, 1993 (adaptado).

Os trechos apresentam divergências conceituais entre autores que sustentam um entendimento segundo o qual a igualdade entre os homens se dá em razão de uma

a) predisposição ao conhecimento.
b) submissão ao transcendente.
c) tradição epistemológica.
d) condição original.
e) vocação política.

Alternativa correta: d) condição original.

Na questão acima, vemos uma das rivalidades mais clássicas da história da filosofia: Hobbes x Rousseau. Apesar de possuírem visões opostas, Hobbes e Rousseau concordam em utilizar uma mesma ideia central, o estado de natureza humano.

O estado de natureza é uma abstração, uma ideia imaginada sobre condição original dos seres humanos. Um momento pré-social da humanidade onde os indivíduos possuem apenas a liberdade dada pela natureza (liberdade natural), assim como os outros animais.

Os autores divergem quanto ao que seria essa condição original da humanidade.

  • Para Hobbes, a humanidade em estado de natureza seria a humanidade em uma guerra de todos contra todos. Na natureza somos os nossos maiores inimigos. Para o autor, "o homem é o lobo do homem".
  • Para Rousseau, os seres humanos são naturalmente bons. Em estado de natureza, o ser humano estaria em estado de felicidade aproveitando ao máximo sua liberdade natural. Para o autor, o ser humano seria o "bom selvagem".

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Para os filósofos, não há uma predisposição ao conhecimento comum aos seres humanos, estes se ligam apenas pelo sentido atribuído pela natureza.

b) O estado de natureza explicado por Hobbes e Rousseau consiste, justamente, em um estado de liberdade natural que é estar submetido apenas às leis da natureza.

c) Os dois filósofos não identificam nos seres humanos raízes ou uma tradição epistemológica comum.

e) Para eles, os seres humanos não possuem uma vocação política. Tanto o "bom selvagem", de Rousseau, quanto o "homem lobo do homem", de Hobbes, apontam para a não aptidão natural à política.

Questão 13

(Enem/2017) Uma pessoa vê-se forçada pela necessidade a pedir dinheiro emprestado. Sabe muito bem que não poderá pagar, mas vê também que não lhe emprestarão nada se não prometer firmemente pagar em prazo determinado. Sente a tentação de fazer a promessa; mas tem ainda consciência bastante para perguntar a si mesma: não é proibido e contrário ao dever livrar-se de apuros desta maneira? Admitindo que se decida a fazê-lo, a sua máxima de ação seria: quando julgo estar em apuros de dinheiro, vou pedi-lo emprestado e prometo pagá-lo, embora saiba que tal nunca sucederá.

KANT, l. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo. Abril Cultural, 1980

De acordo com a moral kantiana, a “falsa promessa de pagamento” representada no texto

a) Assegura que a ação seja aceita por todos a partir livre discussão participativa.
b) Garante que os efeitos das ações não destruam a possibilidade da vida futura na terra.
c) Opõe-se ao princípio de que toda ação do homem possa valer como norma universal.
d) Materializa-se no entendimento de que os fins da ação humana podem justificar os meios.
e) Permite que a ação individual produza a mais ampla felicidade para as pessoas envolvidas.

Alternativa correta: c) Opõe-se ao princípio de que toda ação do homem possa valer como norma universal.

Essa questão exige dos participantes um estudo sobre a moral de Kant, sobretudo, do seu Imperativo Categórico, que é uma espécie de fórmula kantiana para a resolução das questões morais.

Com o Imperativo Categórico kantiano temos a resposta para a questão. Ao realizar a “falsa promessa de pagamento”, quem pede o dinheiro emprestado mente e "usa" quem vai lhe emprestar o dinheiro. A pessoa que empresta o dinheiro é tida como um simples meio para a resolução dos problemas financeiros da outra.

Podemos concluir também que a "falsa promessa" nunca poderá ser entendida como norma universal ou lei da natureza. Se as promessas forem sempre falsas perdem o seu sentido e podem, em último caso, impedir que as pessoas confiem umas nas outras.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Para Kant, as ações devem ser avaliadas apartadas de seu contexto e julgadas pela razão. A ação moral não é um acordo ou contrato coletivo.

b) A ação deve ser julgada em sua relação apenas com o dever. Não está em causa, para Kant, os possíveis efeitos da ação.

d) Essa concepção aproxima-se da perspectiva de Maquiavel sobre a moral do Príncipe em que as ações são maneiras válidas (meios) para se alcançar um objetivo (fim).

e) A produção de felicidade se relaciona com o pensamento de utilitarista de Stuart Mill. Para ele, as ações devem ser julgadas pelo máximo de felicidade (objetivo da natureza humana) que elas podem gerar.

Questão 14

(Enem/2019) TEXTO I
Duas coisas enchem o ânimo de admiração e veneração sempre crescentes: o céu estrelado sobre mim e a lei moral em mim.
KANT, I. Crítica da razão prática. Lisboa: Edições 70, s/d (adaptado).

TEXTO II
Duas coisas admiro: a dura lei cobrindo-me e o estrelado céu dentro de mim.
FONTELA, O. Kant (relido). In: Poesia completa. São Paulo: Hedra, 2015.

A releitura realizada pela poeta inverte as seguintes ideias centrais do pensamento kantiano:

a) Possibilidade da liberdade e obrigação da ação.
b) Aprioridade do juízo e importância da natureza.
c) Necessidade da boa vontade e crítica da metafísica.
d) Prescindibilidade do empírico e autoridade da razão.
e) Interioridade da norma e fenomenalidade do mundo.

Alternativa correta: e) Interioridade da norma e fenomenalidade do mundo.

No trecho retirado do livro Crítica da razão prática, Kant afirma duas de suas ideias centrais:

  • a interioridade das normas morais como um juízo a priori, inato;
  • o mundo como um fenômeno, uma manifestação, impossibilitando o conhecimento da essência das coisas (a coisa-em-si).

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Não estão em causa a possibilidade da liberdade e a obrigação da ação, mas "lei moral em mim".

b) Kant compreende a natureza a partir de seu viés fenomenológico, sua importância se dá a partir do conhecimento humano.

c) No pensamento kantiano, a boa vontade está subordinada à ideia do dever. Vale ressaltar que a crítica de Kant à metafísica, diz respeito à metafísica tradicional.

d) Apesar de Kant reforçar a ideia de autoridade da razão, ele expõe os seus limites e valoriza também o campo empírico através dos fenômenos.

O pensamento kantiano marcado pela tentativa de conciliar a tradição racionalista com o empirismo.

Questão 15

(Enem/2013) Até hoje admitia-se que nosso conhecimento se devia regular pelos objetos; porém, todas as tentativas para descobrir, mediante conceitos, algo que ampliasse nosso conhecimento, malogravam-se com esse pressuposto. Tentemos, pois, uma vez, experimentar se não se resolverão melhor as tarefas da metafísica, admitindo que os objetos se deveriam regular pelo nosso conhecimento.

KANT, I. Crítica da razão pura. Lisboa: Calouste-Gulbenkian, 1994 (adaptado).

O trecho em questão é uma referência ao que ficou conhecido como revolução copernicana na filosofia. Nele, confrontam-se duas posições filosóficas que

a) assumem pontos de vista opostos acerca da natureza do conhecimento.
b) defendem que o conhecimento é impossível, restando-nos somente o ceticismo.
c) revelam a relação de interdependência entre os dados da experiência e a reflexão filosófica.
d) apostam, no que diz respeito às tarefas da filosofia, na primazia das ideias em relação aos objetos.
e) refutam-se mutuamente quanto à natureza do nosso conhecimento e são ambas recusadas por Kant.

Alternativa correta: a) assumem pontos de vista opostos acerca da natureza do conhecimento.

Para Kant, o confronto entre a posição empirista e a posição racionalista supõe que o conhecimento está ancorado na relação sujeito-objeto, tendo o objeto como o centro das atenções.

O filósofo afirma que o conhecimento deve basear-se nas nossas ideias.

Sendo assim, buscou, a partir de uma analogia à teoria heliocêntrica de Copérnico, estabelecer as ideias, e não os objetos, como o centro do conhecimento.

As outras alternativas estão erradas porque:

b) Somente o pensamento empirista pode estar de acordo com o ceticismo. Para os racionalistas, todo conhecimento é resultado da própria Razão.

c) O que se revela é a centralidade do sujeito como fonte do conhecimento.

d) A primazia das ideias é a base do pensamento kantiano, mas não estão nas ideias que se confrontam no texto.

e) Kant faz uma crítica ao pensamento da tradição filosófica, mas busca uma síntese entre as correntes opostas.

Questão 16

(Enem/2016) Sentimos que toda satisfação de nossos desejos advinda do mundo assemelha-se à esmola que mantém hoje o mendigo vivo, porém prolonga amanhã a sua fome. A resignação, ao contrário, assemelha-se à fortuna herdada: livra o herdeiro para sempre de todas as preocupações.

SCHOPENHAUER, A. Aforismo para a sabedoria da vida. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

O trecho destaca uma ideia remanescente de uma tradição filosófica ocidental, segundo a qual a felicidade se mostra indissociavelmente ligada à

a) a consagração de relacionamentos afetivos.
b) administração da independência interior.
c) fugacidade do conhecimento empírico.
d) liberdade de expressão religiosa.
e) busca de prazeres efêmeros.

Alternativa correta: b) administração da independência interior.

Schopenhauer é conhecido como o filósofo do pessimismo. Afirmava que a vida é sofrimento e os indivíduos se frustram por idealizar que os poucos momentos de felicidade existentes na vida são uma regra e não um breve momento de exceção.

Com isso, afirma que a resignação é libertadora, sendo a administração da independência interior, a autodeterminação da vontade e do livre-arbítrio.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Apesar de Schopenhauer ter dedicado algumas linhas para um assunto que para ele é sub-estudado pela filosofia - o amor - não encontra nas relações afetivas algo que possa ser consagrado ou sacralizado.

Para ele, o amor é um dispositivo da natureza para a reprodução da espécie. O filósofo compreendia que os seres humanos, por seu caráter racional, poderiam, simplesmente, optar por não se reproduzir. O amor seria um impulso natural que se sobrepõe à razão e faz com que os seres humanos procurem no outro aquilo que os faltam, proporcionando o equilíbrio da espécie.

c) Não está em questão o conhecimento a partir da experiência. O pensamento schopenhaueriano tende ao idealismo, compreendendo que o conhecimento está relacionado com a vontade e não com a experiência sensível.

d) A felicidade não está relacionada à questão da liberdade de expressão religiosa. Aliás, o filósofo dá início a uma crítica a moral cristã que foi desenvolvida mais duramente por Nietzsche.

e) O pensamento de Schopenhauer afirma o caráter efêmero da felicidade, mas essa ideia não faz parte da tradição filosófica.

Na verdade, Schopenhauer inicia uma corrente de pensamento que aproxima a filosofia ocidental do pensamento oriental, buscando uma concepção distinta de felicidade, sofrimento e prazer.

Questão 17

(Enem/2019) Em sentido geral e fundamental, Direito é a técnica da coexistência humana, isto é, a técnica voltada a tornar possível a coexistência dos homens. Como técnica, o Direito se concretiza em um conjunto de regras (que, nesse caso, são leis ou normas); e tais regras têm por objeto o comportamento intersubjetivo, isto é, o comportamento recíproco dos homens entre si.
ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

O sentido geral e fundamental do Direito, conforme foi destacado, refere-se à

a) aplicação de códigos legais.
b) regulação do convívio social.
c) legitimação de decisões políticas.
d) mediação de conflitos econômicos.
e) representação da autoridade constituída.

Alternativa correta: b) regulação do convívio social.

No texto, o Direito é compreendido como uma técnica que tem como objetivo possibilitar a "coexistência dos homens" ("homens" aqui tomado como sinônimo de seres humanos).

Assim, a formulação de um conjunto de regras busca a regulação do convívio social, possibilitando uma relação justa e recíproca entre os sujeitos.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A aplicação de códigos legais refere-se à forma pela qual o direito visa regular o convívio social, e não o seu fundamento.

c) A legitimação de decisões políticas transcende o direito e, em Estados democráticos, fundamenta-se na vontade geral da população.

d) A mediação de conflitos econômicos é apenas uma parte das disputas possíveis dentro da sociedade. Cabe ao direito atuar nessa área, mas não define a sua atividade.

e) Já a representação da autoridade constituída, nas sociedades modernas, apresenta-se a partir da tri-partição do poder: executivo, legislativo e judiciário. Assim, o direito, inscrito no poder judiciário é uma parcela relevante, mas não é o todo da representação.

Questão 18

(Enem/2019) Essa atmosfera de loucura e irrealidade, criada pela aparente ausência de propósitos, é a verdadeira cortina de ferro que esconde dos olhos do mundo todas as formas de campos de concentração. Vistos de fora, os campos e o que neles acontece só podem ser descritos com imagens extraterrenas, como se a vida fosse neles separada das finalidades deste mundo. Mais que o arame farpado, é a irrealidade dos detentos que ele confina que provoca uma crueldade tão incrível que termina levando à aceitação do extermínio como solução perfeitamente normal. ARENDT, H. Origens do totalitarismo. São Paulo: Cia. das Letras, 1989 (adaptado).

A partir da análise da autora, no encontro das temporalidades históricas, evidencia-se uma crítica à naturalização do(a)

a) ideário nacional, que legitima as desigualdades sociais.
b) alienação ideológica, que justifica as ações individuais.
c) cosmologia religiosa, que sustenta as tradições hierárquicas.
d) segregação humana, que fundamenta os projetos biopolíticos.
e) enquadramento cultural, que favorece os comportamentos punitivos.

Alternativa correta: d) segregação humana, que fundamenta os projetos biopolíticos.

Hannah Arendt chama a atenção para a desumanização dos indivíduos enviados para os campos de concentração como uma característica presente em regimes totalitários.

A separação (segregação) desses seres humanos e a retirada de sua realidade fundamentam os projetos de violência a que são submetidos e enquadrando como dentro de uma normalidade.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) As desigualdades sociais fundamentam um ideário nacional e favorecem a perseguição a grupos sociais dentro dos regimes totalitários.

b) Os regimes totalitários possuem uma forte ideologia e impedem as ações individuais.

c) Não há nada no texto que aponte para uma naturalização de uma cosmologia religiosa.

e) Os enquadramentos culturais, ainda que favoreçam comportamentos punitivos, não fundamentam a existência dos campos de extermínio.

Questão 19

(Enem/2019) Penso que não há um sujeito soberano, fundador, uma forma universal de sujeito que poderíamos encontrar em todos os lugares. Penso, pelo contrário, que o sujeito se constitui através das práticas de sujeição ou, de maneira mais autônoma, através de práticas de liberação, de liberdade, como na Antiguidade — a partir, obviamente, de um certo número de regras, de estilos, que podemos encontrar no meio cultural.
FOUCAULT, M. Ditos e escritos V: ética, sexualidade, política. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

O texto aponta que a subjetivação se efetiva numa dimensão

a) legal, pautada em preceitos jurídicos.
b) racional, baseada em pressupostos lógicos.
c) contingencial, processada em interações sociais.
d) transcendental, efetivada em princípios religiosos.
e) essencial, fundamentada em parâmetros substancialistas.

Alternativa correta: c) contingencial, processada em interações sociais.

O pensamento de Foucault, expresso no texto, aponta para a impossibilidade de um "ser absoluto" ou uma ideia de sujeito universal, ou seja, o sujeito é contingente.

Ele afirma também que esse sujeito se efetiva a partir das interações que ocorrem no meio cultural (social).

As outras alternativas estão erradas porque:

a) Não são os preceitos jurídicos que efetivam o sujeito.

b) A subjetivação não se dá através de preceitos lógicos.

d) A transcendência e os princípios religiosos não estão expressos como fundamentos da construção dos sujeitos.

e) A subjetivação a partir de uma essência é, justamente, a crítica realizada por Foucault e ele aponta para a sua impossibilidade.

Questão 20

(Enem/2019) A hospitalidade pura consiste em acolher aquele que chega antes de lhe impor condições, antes de saber e indagar o que quer que seja, ainda que seja um nome ou um “documento” de identidade. Mas ela também supõe que se dirija a ele, de maneira singular, chamando-o portanto e reconhecendo-lhe um nome próprio: “Como você se chama?” A hospitalidade consiste em fazer tudo para se dirigir ao outro, em lhe conceder, até mesmo perguntar seu nome, evitando que essa pergunta se torne uma “condição”, um inquérito policial, um fichamento ou um simples controle das fronteiras. Uma arte e uma poética, mas também toda uma política dependem disso, toda uma ética se decide aí.
DERRIDA, J. Papel-máquina. São Paulo: Estação Liberdade, 2004 (adaptado).

Associado ao contexto migratório contemporâneo, o conceito de hospitalidade proposto pelo autor impõe a necessidade de

a) anulação da diferença.
b) cristalização da biografia.
c) incorporação da alteridade.
d) supressão da comunicação.
e) verificação da proveniência.

Alternativa correta: c) incorporação da alteridade.

No texto, Jacques Derrida (1930-2005) desenvolve o conceito de hospitalidade a partir da ideia de aceitação do outro, ou melhor, "incorporação da alteridade".

Receber o outro, aquele que migra, sem impor condições para que isso aconteça exige uma estrutura de pensamento (poética, política e ética).

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A anulação da diferença exige que o indivíduo migrante adeque-se ao local de chegada, negando suas particularidades, diferenças e sua própria existência.

Assim, não se pressupõe a hospitalidade, mas uma invisibilização e negação do outro.

b) A cristalização da biografia pode sugerir a separação (por cristalização) da identidade do que recebe da identidade do recebido. Isso reforça a não integração do migrante.

d) A supressão da comunicação significa um impedimento à comunicação contrariando a ideia de Derrida que afirma que "A hospitalidade consiste em fazer tudo para se dirigir ao outro (...)", ou seja, pressupõe a necessidade de uma comunicação.

e) A verificação da proveniência reforça o caráter de "inquérito policial" e de "controle das fronteiras" o que impede a hospitalidade para Derrida.

Questão 21

(Enem/2020) TEXTO I

Os meus pensamentos são todos sensações. Penso com os olhos e com os ouvidos E com as mãos e os pés E com o nariz e a boca.
PESSOA, F. O guardador de rebanhos – IX. In: GALHOZ, M. A. (Org.). Obras poéticas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999 (fragmento).

TEXTO II

Tudo aquilo que sei do mundo, mesmo por ciência, eu o sei a partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da ciência não poderiam dizer nada.
MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999 (adaptado).

Os textos mostram-se alinhados a um entendimento acerca da ideia de conhecimento, numa perspectiva que ampara a

a) anterioridade da razão no domínio cognitivo.
b) confirmação da existência de saberes inatos.
c) valorização do corpo na apreensão da realidade.
d) verificabilidade de proposições no campo da lógica.
e) possibilidade de contemplação de verdades atemporais.

Alternativa correta: c) valorização do corpo na apreensão da realidade.

Os textos recorrem a elementos presentes no corpo, e concebem o conhecimento a partir da sensibilidade, a partir de todos os sentidos como no Texto I ou a partir da experiência dos sentidos como no Texto II.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A anterioridade da razão é uma característica do racionalismo, bem distinta da visão apresentada nos textos.

b) No Texto II, Merleau-Ponty é bem claro em seu posicionamento contrário aos saberes inatos quando diz: "Tudo aquilo que sei do mundo (...) eu o sei a partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo...".

d) A lógica, assim como a ciência, está determinada pela visão e pela experiência.

e) Não há verdades atemporais porque as verdades estão fundamentadas na experiência sensível, que é temporal.

Questão 22

(Enem/2020) Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhe parece um bem; se todas as comunidades visam algum bem, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens.
ARISTÓTELES. Política. Brasília: UnB,1988

No fragmento, Aristóteles promove uma reflexão que associa dois elementos essenciais à discussão sobre a vida em comunidade, a saber:

a) Ética e política, pois conduzem à eudaimonia.
b) Retórica e linguagem, pois cuidam dos discursos na ágora.
c) Metafísica e ontologia, pois tratam da filosofia primeira.
d) Democracia e sociedade, pois se referem a relações sociais.
e) Geração e corrupção, pois abarcam o campo da physis.

Alternativa correta: a) Ética e política, pois conduzem à eudaimonia.

Aristóteles compreende os seres humanos como animais políticos, ou seja, destinado a viver na pólis, viver em sociedade. Assim, as atividades ligadas à própria natureza sociável humana (a ética e a política) serão responsáveis por conduzir os seres humanos a sua finalidade, compreendida como eudaimonia (felicidade, vida bem vivida).

As outras alternativas estão erradas porque:

b) A retórica e a linguagem são objetos centrais para os sofistas, em Aristóteles a política assume esse papel central.

c) A metafísica e a ontologia não são suficientes para fazer com que os seres humanos cumpram a sua finalidade, o bem viver (eudaimonia).

d) As relações sociais são características fundamentais dos indivíduos, mas só podem ser compreendidas a partir da ética e da política.

e) A physis era o objeto de estudo dos filósofos do período pré-socrático, anterior a Aristóteles.

Questão 23

(Enem/2020) Adão, ainda que supuséssemos que suas faculdades racionais fossem inteiramente perfeitas desde o início, não poderia ter inferido da fluidez e transparência da água que ela o sufocaria, nem da luminosidade e calor do fogo que este poderia consumi-lo. Nenhum objeto jamais revela, pelas qualidades que aparecem aos sentidos, nem as causas que o produziram, nem os efeitos que dele provirão; e tampouco nossa razão é capaz de extrair, sem auxílio da experiência, qualquer conclusão referente à existência efetiva de coisas ou questões de fato.
HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento humano. São Paulo: Unesp, 2003.

Segundo o autor, qual é a origem do conhecimento humano?

a) A potência inata da mente.
b) A revelação da inspiração divina.
c) O estudo das tradições filosóficas.
d) A vivência dos fenômenos do mundo.
e) O desenvolvimento do raciocínio abstrato.

Alternativa correta: d) A vivência dos fenômenos do mundo.

David Hume é um defensor do empirismo, corrente filosófica que afirma que o conhecimento tem origem na experiência.

No texto, ele faz uma crítica ao pensamento racionalista, afirma que Adão, o primeiro homem, por mais que possuísse uma razão perfeita, careceria da vivência dos fenômenos no mundo para construir os conhecimentos mais simples. Já que não haveria ninguém com uma experiência anterior para ensinar-lhe e devido ao fato da razão ser insuficiente para inferir esse tipo de conhecimento.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A potência inata da mente não seria suficiente para que Adão pudesse conhecer tudo aquilo que o cerca.

b) Não está em causa a revelação da inspiração divina.

c) A origem do conhecimento não está no estudo das tradições filosóficas.

e) O desenvolvimento do raciocínio abstrato não basta para construir o conhecimento, é o que demonstra o texto.

Questão 24

(Enem/2020) Será que as coisas lhe pareceriam diferentes se, de fato, todas elas existissem apenas na sua mente — se tudo o que você julgasse ser o mundo externo real fosse apenas um sonho ou alucinação gigante, de que você jamais fosse despertar? Se assim fosse, então é claro que você nunca poderia despertar, como faz quando sonha, pois significaria que não há mundo “real” no qual despertar. Logo, não seria exatamente igual a um sonho ou alucinação normal.
NAGEL, T. Uma breve introdução à filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

O texto confere visibilidade a uma doutrina filosófica contemporânea conhecida como:

a) Personalismo, que vincula a realidade circundante aos domínios do pessoal.
b) Falsificacionismo, que estabelece ciclos de problemas para refutar uma conjectura.
c) Falibilismo, que rejeita mecanismos mentais para sustentar uma crença inequívoca.
d) Idealismo, que nega a existência de objetos independentemente do trabalho cognoscente.
e) Solipsismo, que reconhece limitações cognitivas para compreender uma experiência compartilhada.

Alternativa correta: e) Solipsismo, que reconhece limitações cognitivas para compreender uma experiência compartilhada.

O solipsismo é a doutrina filosófica que compreende a incapacidade de afirmar a existência de entes (seres ou objetos) fora da consciência do indivíduo pensante. O solipsismo afirma que toda a realidade é objeto da consciência do ser pensante.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) O personalismo pressupõe que o todo da realidade se configura a partir das relações entre as pessoas (personas), se opondo ao individualismo, que toma o indivíduo como o principal elemento.

b) O falsificacionismo, teoria desenvolvida por Karl Popper, afirma que a validade de uma tese se encontra na possibilidade de que seja "falseada", tornada falsa a partir da verificação. Todo o conhecimento é um conhecimento provisório, que resistiu (por enquanto) à verificação.

c) O falibilismo, teoria proposta por Charles Sanders Peirce, afirma que não há nenhuma verdade absoluta. Toda e qualquer definição é uma definição inscrita no tempo e que se tornará falha a partir da evolução do conhecimento.

d) O idealismo é a base do solipsismo, mas compreende a existência de diferentes seres cognoscentes, ao contrário do que é descrito no texto.

Questão 25

(Enem/2020) Montaigne deu o nome para um novo gênero literário; foi dos primeiros a instituir na literatura moderna um espaço privado, o espaço do “eu”, do texto íntimo. Ele cria um novo processo de escrita filosófica, no qual hesitações, autocríticas, correções entram no próprio texto.
COELHO, M. Montaigne. São Paulo: Publifolha, 2001 (adaptado).

O novo gênero de escrita aludido no texto é o(a)

a) confissão, que relata experiências de transformação.
b) ensaio, que expõe concepções subjetivas de um tema.
c) carta, que comunica informações para um conhecido.
d) meditação, que propõe preparações para o conhecimento.
e) diálogo, que discute assuntos com diferentes interlocutores.

Alternativa correta: b) ensaio, que expõe concepções subjetivas de um tema.

Montaigne e Francis Bacon foram os filósofos responsáveis pela criação dos ensaios filosóficos. Neles, o posicionamento do autor é bem marcado pela utilização da primeira pessoa do singular (eu). Isso rompe com a tradição da filosofia de desenvolver textos impessoais, que transmitiam a ideia de universalidade. Ao situar o "eu", os filósofos assumiam uma reflexão de caráter particular.

As outras alternativas estão erradas porque:

a) A confissão tornou-se conhecida a partir de Santo Agostinho de Hipona.

c) A carta é um gênero muito utilizado na tradição da filosofia. Por exemplo, encontradas nos filósofos Cícero e Sêneca.

d) As meditações são muito marcadas pela obra de Descartes, mas já haviam se tornado célebres com Marco Aurélio, durante o período romano.

e) Os diálogos estão presentes na filosofia socrática.

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Pedro Menezes
Pedro Menezes
Licenciado em Filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Mestre em Ciências da Educação pela Universidade do Porto (FPCEUP).