Poemas de amor de grandes poetas (com comentários)

Márcia Fernandes
Márcia Fernandes
Professora licenciada em Letras

O amor é o sentimento mais comum entre as pessoas. Por ser um tema atemporal e inexplicável e, sobretudo, por passar por todos, não poderia ser esquecido pelos poetas, que têm nesse tema um dos maiores motes para as suas composições.

Confira essas verdadeiras obras-primas da Literatura que o Toda Matéria selecionou para você.

Amor é fogo que arde sem se ver, de Luís de Camões

Luís de Camões
Camões, o maior escritor do Classicismo

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor.

Comentários:

Nesse poema, Luís Vaz de Camões (1524-1580), poeta português que dispensa apresentações, trabalha o tempo todo com antíteses, o que alcança a grande expressividade do poema:

“é ferida que dói, e não se sente;
[...]
é um andar solitário entre a gente;”

É mediante esse recurso estilístico que o autor busca explicar o inexplicável: como é possível alguém sofrer por amor e mesmo assim querer amar?

Assim, termina um dos mais conhecidos poema de amor de todos os tempos:

“Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor.”

Meu destino, de Cora Coralina

Cra Coralina
Cora Coralina, uma das escritoras brasileiras mais importantes

Nas palmas de tuas mãos
leio as linhas da minha vida.
Linhas cruzadas, sinuosas,
interferindo no teu destino.
Não te procurei, não me procurastes –
íamos sozinhos por estradas diferentes.
Indiferentes, cruzamos
Passavas com o fardo da vida…
Corri ao teu encontro.
Sorri. Falamos.
Esse dia foi marcado
com a pedra branca
da cabeça de um peixe.
E, desde então, caminhamos
juntos pela vida…

Comentários:

Nesse poema, Cora Coralina (1889-1985), uma das maiores poetisas brasileiras, relata um encontro proporcionado pelo destino. Esse encontro é inevitável, tal como o amor que dele surgiu.

Conhecida como “escritora das coisas simples”, o seu poema trata do amor de forma descomplicada:

“Corri ao teu encontro.
Sorri. Falamos.
[...]
E, desde então, caminhamos
juntos pela vida…”

As sem-razões do amor, de Carlos Drummond de Andrade

Drummond
Drummond, um dos maiores autores da literatura brasileira

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou de mais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

Comentários:

Nesse poema, Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), o maior poeta brasileiro do século XX, propõe uma explicação do amor através da repetição do verso “Eu te amo porque te amo.”.

Com isso, o poeta quer expressar que o amor é mesmo assim, sincero, sem explicação, não poderia ser de outra forma.

E porque há tantas razões inexplicáveis para amar, Drummond brinca com o título do poema, usando as palavras homófonas (mesma pronúncia e grafias diferentes) “sem” e “cem”.

Com “sem razões”, o poeta expressa que não é possível explicar o amor. Com “cem razões”, o poeta leva o leitor a imaginar que encontrará no poema uma lista de motivos que o levem a se entregar ao amor.

Soneto de Fidelidade, de Vinicius de Moraes

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Comentários:

Nesse poema, Vinicius de Moraes (1913-1980), um dos grandes nomes da música popular brasileira, fala sobre o amor e a fidelidade.

A primeira questão abordada é o zelo, ou seja, a importância urgente e essencial de cuidar de quem amamos. O poeta deixa isto presente ao utilizar as palavras que destacamos em negrito no verso "Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto".

Outra questão abordada são as dificuldades inerentes às relações. A segunda estrofe pode ser interpretada como momentos em que as pessoas riem do pesar das outras ou choram diante do seu contentamento. Combinando os dois últimos versos, temos:

"E rir meu riso ao seu pesar
e derramar meu pranto ou seu contentamento"

Nas duas últimas estrofes, o poema fala do desejo de o amor durar para sempre, que o amor deve acabar apenas com a morte:

"E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte (...)

"(...) que seja infinito enquanto dure."

O amor é uma companhia, de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)

O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.

Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.

Comentários:

Nesse poema, Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa (1888-1935), um dos maiores poetas da língua portuguesa, fala sobre o companheirismo que deve existir entre os casais. Assim diz o segundo verso "Já não sei andar só pelos caminhos".

Além do companheirismo, o poeta aborda o ânimo sentido pelas pessoas que amam, ânimo que parece fortalecê-las. Mas, ao mesmo tempo que se sentem fortes ("e sou forte como as árvores altas"), as pessoas também se sentem frágeis e trêmulas, pois têm medo de desapontar aqueles que amam ("Mas se a vejo tremo").

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Márcia Fernandes
Márcia Fernandes
Professora, produz conteúdos educativos (de língua portuguesa e também relacionados a datas comemorativas) desde 2015. Licenciada em Letras pela Universidade Católica de Santos (habilitação para Ensino Fundamental II e Ensino Médio) e formada no Curso de Magistério (habilitação para Educação Infantil e Ensino Fundamental I).