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A Origem da Filosofia

Diogo Orsi
Diogo Orsi
Professor de Filosofia e Sociologia

A filosofia nasceu na Grécia antiga, no início do século VI a.C. Tales de Mileto é reconhecido como o primeiro filósofo; apesar disso, foi outro filósofo, Pitágoras, quem cunhou o termo “filosofia”, junção de “phílos” (amor) e “sophía” (sabedoria), significando “amor à sabedoria”.

Desde então, a filosofia é a atividade que se dedica a compreender, identificar e comunicar a realidade por meio de conceitos lógico-racionais. Ela surgiu do abandono gradual das explicações dadas pela mitologia (desmitificação) e da busca por um conhecimento mais seguro. Segundo a leitura histórica hoje consolidada, essa passagem não é “um milagre”, mas resultado de transformações sociais e políticas que reconfiguraram a experiência grega: o fim do antigo poder palaciano e o nascimento da pólis, onde a vida pública, o debate e a deliberação entre cidadãos ganharam centralidade.

Neste conteúdo você encontra:

Da consciência mítica à consciência filosófica

A Criação de Adão, afresco de Michelangelo
Michelangelo - A Criação de Adão (estreita ligação entre os homens e os deuses)

A consciência mítica era caracterizada por explicações tradicionais presentes nas histórias mitológicas. A mitologia grega, por ser politeísta, é composta por uma série de entidades – deuses, titãs e outros seres – que se relacionavam, faziam surgir e davam sentido ao universo.

Essas explicações possuíam um caráter fabuloso, com narrativas ricas em imagens, constituindo cultura popular transmitida por tradição oral. Essas histórias eram contadas pelos poetas-rapsodos.

Durante muito tempo, essas histórias explicaram a cultura grega e a origem de todas as coisas. Não havia distinção clara entre religião e outras atividades: todos os aspectos da vida humana estavam diretamente relacionados com os deuses e divindades que regiam o universo.

Aos poucos, essa mentalidade foi se transformando. Alguns fatores fizeram com que pessoas na Grécia antiga passassem a relativizar esse conhecimento e a pensar novas possibilidades de explicação.

Dessa relativização, nasce a necessidade de encontrar explicações cada vez melhores para todas as coisas. A crença vai dando lugar à argumentação, à capacidade de convencer e de oferecer razões, ou seja, ao lógos.

O lógos é identificado como discurso racional: objetivo, claro e ordenado. Assim, o pensamento grego foi abandonando a crença (consciência mítica) para assumir o que “faz sentido”, o que possui lógica e pode ser explicado pelo ser humano (consciência filosófica). Esse movimento intelectual veio acompanhado de uma mudança institucional: nas cidades, os assuntos coletivos passaram a ser discutidos “à luz do dia”, na ágora, por cidadãos considerados iguais em direitos políticos – o que favoreceu o surgimento de critérios de prova, refutação e publicidade do argumento.

Condições históricas para o surgimento da filosofia

Mapa Grécia Antiga
Grécia Antiga, geografia acidentada exigiu o domínio do mar

Muitas vezes chamado de “milagre grego”, o surgimento da filosofia não dependeu de um milagre. Uma série de fatores conduziu à relativização do pensamento, à desmitificação e à busca de melhores explicações sobre a realidade. Entre eles:

1. O comércio, as navegações e a diversidade cultural

Pela posição geográfica e estrutura social, a Grécia tornou-se centro de comércio e potência marítima. O contato com outras culturas levou os gregos a relativizar o olhar sobre costumes alheios e, por extensão, sobre os seus próprios.

2. O surgimento da escrita alfabética

O alfabeto (sendo alfa "alfa" e beta "beta", as duas primeiras letras gregas) foi uma tecnologia decisiva. A escrita por ideogramas remete a imagens culturais; a escrita alfabética exige maior abstração, pois relaciona fonemas a sinais, favorecendo o pensamento analítico.

Além disso, a nova escrita deixa de ser um instrumento fechado de palácio (como nos arquivos micênicos) e passa a servir à publicidade das normas e decisões, ampliando a circulação do discurso e da lei.

3. O surgimento da moeda

A moeda exige abstração: trocas antes diretas passam a ser mediadas por um equivalente reconhecido, o que estimula cálculos, equivalências e medidas.

4. A invenção do calendário

O calendário revela regularidades naturais (estações do ano). Essa organização retira dos deuses o controle imediato do clima, deslocando-o para a observação, o cálculo e a previsão astronômica.

5. O surgimento da vida pública (a política)

Com o desenvolvimento da pólis, intensifica-se a vida pública. Mais habitantes compartilham o mesmo espaço e voltam sua atenção para a organização desse espaço (política).

No lugar do “rei divino” do mundo micênico, a cidade passa a distribuir funções (militar, religiosa, deliberativa) e a regular o poder por meio de magistraturas e assembleias, substituindo a figura única do soberano por um equilíbrio entre órgãos e leis.

6. O surgimento da razão

A população grega passa a demandar explicações mais coerentes com o novo grau de abstração e de desmitificação. O cidadão livre, tradicionalmente afastado do trabalho manual (atribuído a escravos e estrangeiros), dedica-se ao ócio contemplativo, observa a natureza e busca causas e ordem.

A sociedade aristocrática competitiva (agón) também valoriza o confronto público de discursos – uma “luta de argumentos” que educa para a prova e para a refutação, preparando a atitude filosófica.

O nascimento da filosofia

É nesse contexto que surge a filosofia. A investigação sobre a natureza fez com que os filósofos produzissem conhecimento. Inicialmente, a filosofia foi uma cosmologia: o estudo do universo (cosmo) com base na razão (lógos).

Essa perspectiva contrasta com a anterior, a cosmogonia, que explicava o cosmo a partir de narrativas sobre o seu nascimento (génesis). De modo análogo, distingue-se teologia (discurso racional sobre os deuses) de teogonia (histórias sobre o nascimento dos deuses).

Para compreender melhor essa distinção entre a mitologia e a filosofia, confira a tabela abaixo:

Mitologia Filosofia
Crença (Mitos) Razão (Lógos)
Cosmogonia / Teogonia Cosmologia / Teologia
Explicações fabulosas e fantasiosas Explicações racionais e fundamentadas
Rapsodos Filósofos

Os primeiros filósofos

Mente e Natureza
Os primeiros filósofos buscaram encontrar uma ordem na phýsis (natureza)

Os primeiros filósofos, conhecidos como pré-socráticos (a partir do final do século VII a.C.), dedicaram-se à investigação da phýsis (natureza). Buscaram princípios para a formação do mundo.

A natureza, agora desmitificada, torna-se objeto de estudo; o objetivo era encontrar o elemento primordial (arché) que teria dado origem a tudo

Período antropológico e o estabelecimento da filosofia

Homem Vitruviano - DaVinci
Leonardo Da Vinci (1452-1519) - Homem Vitruviano e outras invenções. (centralidade na humanidade, ser humano pensado como criatura e criador), essa concepção só foi possível a partir do legado grego

Com o amadurecimento do pensamento filosófico e a complexificação da vida pública, a investigação abandona gradativamente as questões sobre a natureza e se volta às atividades humanas.

Esse novo momento é chamado de Período Antropológico e tem em Sócrates (469 a.C.-399 a. C.) o seu marco: não como o “pai da filosofia”, mas enquanto modelo da "atitude filosófica" baseada no diálogo, na ironia e na busca do exame de si. Sócrates apreciava tanto o poder do diálogo vivo (ou "dialética") e do confronte de ideias que não deixou nenhum texto escrito para a posteridade.

O principal discípulo de Sócrates, conhecido como Platão (c. 428 a. C.-348 a. C.), encarregou-se de formalizar por escrito os ensinamentos do seu mestre e as suas próprias ideias, deixando uma obra que influenciou todo o pensamento ocidental a partir de então.

Já Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão, além de ter desenvolvido um vasto trabalho filosófico, foi professor do Imperador Alexandre, o Grande e responsável pela popularização do pensamento grego, concretizando o legado da filosofia grega.

Linha do tempo


Linha do tempo sobre a origem da filosofia.

Referências Bibliográficas

ABRÃO, Siqueira Bernardette (Org. e Red.). História da Filosofia. Rev. Mirtes Ugeda Coscodai. São Paulo: Nova Cultural, 1999

CHATELET, François (Dir.). História da Filosofia: Vol. I A Filosofia Pagã, Rio de Janeiro: Zahar, 1973

VERNANT, Jean-Pierre. Mito e pensamento entre os gregos: estudos de psicologia histórica. 2 ed. Trad. Haiganuch Sarian. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990

Diogo Orsi
Diogo Orsi
Bacharel (PUC/SP) e licenciado (UniBF) em Filosofia. Mestrando em Filosofia (Unifesp), com ênfase em filosofia política contemporânea.