Estrutura fundiária: o que é, características e exemplos no Brasil
Estrutura fundiária é a organização da terra e as consequências sociais, políticas, econômicas e ambientais disso.
Ao falar de estrutura fundiária alguns elementos estão presentes: tamanho das propriedades, distribuição histórica das terras, quem controla a terra e desigualdades ou conflitos que surgem desse controle.
Através da estrutura fundiária é possível compreender muitos aspectos da realidade brasileira. Dentre eles a produção do setor agropecuário, as relações sociais e de trabalho no campo, e as questões ambientais.
Características da estrutura fundiária brasileira
Historicamente a estrutura fundiária brasileira é marcada pela desigualdade e concentração de terras. Isso tem impactos diretos nas relações sociais e na produção do campo.
A seguir as características da estrutura fundiária brasileira:
1. Concentração fundiária
O Brasil tem uma das maiores concentrações de terra do mundo. Significa dizer que poucos proprietários são donos de áreas enormes, enquanto milhões de famílias dependem de pequenas porções para sobreviver. Segundo o IBGE, 1% dos estabelecimentos rurais concentram 47,6% de toda área agrícola do país.
De acordo com dados do Censo Agropecuário de 2017, grandes estabelecimentos (com mais de 2.500 hectares) são cerca de 32,8% da área total de estabelecimentos rurais.
Já os estabelecimentos pequenos (com menos de 50 hectares) são apenas 12,8% do total da área produtiva.
Muitas vezes, as grandes propriedades, são parcialmente improdutivas ou utilizam a pecuária extensiva para justificar algum uso. Enquanto isso, as pequenas propriedades produzem com alta intensidade mesmo em pouco espaço.
A concentração fundiária gera desigualdades socioeconômicas no campo e, muitas vezes, intensifica o êxodo rural e a violência.
2. Predomínio de latifúndios em áreas mais produtivas
As regiões do Centro-Oeste, Matopiba e partes do Sul e Sudeste concentram latifúndios de produção exportadora. São grandes propriedades monocultoras, produtoras de milho, soja, algodão e carne bovina.
Isso também demonstra a concentração de terras nessas áreas. De acordo com dados de 2025 da Comissão Pastoral da Terra, os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul lideram o ranking nacional de concentração de terra. Muitas propriedades nesses estados estão acima de 35 módulos fiscais, ou seja, são maiores do que o necessário para produzir o suficiente.
3. Presença de minifúndios e agricultura familiar
As pequenas propriedades concentram-se no Sul, Sudeste e áreas do Nordeste.
A agricultura familiar no Brasil recebe menos incentivo econômico e tem menos acesso ao crédito e à tecnologia do que o agronegócio. Isso aprofunda ainda mais a desigualdade no campo.
Mesmo com as dificuldades, essas famílias produzem grande parte dos alimentos consumidos no Brasil, como feijão, mandioca e hortaliças.
De acordo com dados do INCRA, em 2024 mais de 70.000 famílias foram assentadas em novas terras.
4. Pequenas propriedades são a maioria dos estabelecimentos
As pequenas propriedades são 81,3% dos estabelecimentos rurais, porém ocupam apenas 12,8% da área produtiva total.
Essa representatividade demonstra que existe muita gente com pouca terra e pouca gente com muita terra, confirmando a característica de concentração fundiária que existe no Brasil.
5. Grilagem e irregularidades
O histórico de ocupação das terras brasileiras é cheio de irregularidades. Muitas vezes os limites entre as propriedades não são claros ou foram falsificados em documentos.
Em áreas onde a ocupação e a colonização foram tardias, como a Amazônia, as irregularidades são ainda maiores.
As falsificações de títulos de terra, como a grilagem, facilitam invasões e ocupações ilegais, favorecendo até mesmo a violência e o desmatamento.

Consequências da estrutura fundiária brasileira
A partir das características apresentadas, a forma como a estrutura fundiária brasileira se estabeleceu gera impactos socioeconômicos, ambientais e até políticos.
A concentração de terra e as dificuldades no acesso ao crédito aprofundam desigualdades socioeconômicas, porque coloca poder nas mãos dos grandes proprietários, enquanto os pequenos agricultores sofrem com a baixa renda e as dificuldades econômicas.
A pobreza no campo e a falta de oportunidades de trabalho aprofundam o êxodo rural, levando a população mais pobre do campo a migrar para as cidades.
A desigualdade de acesso à terra no campo gera conflitos entre diferente atores, e prejudica principalmente os grupos mais vulneráveis. Segundo a Comissão Pastoral da Terra, em 2024 foram registrados 2.185 conflitos no campo. As vítimas mais comuns da violência no campo são os indígenas (29% dos casos), posseiros (25%), quilombolas (13%) e componentes do MST (11%).
A estrutura fundiária afeta diretamente o meio ambiente. A presença de grandes propriedades monocultoras para exportação contribui para o desmatamento e a poluição através do uso intensivo de agrotóxicos. Além disso, queimadas ilegais são realizadas em boa parte do Brasil, com o objetivo de abrir terra para o pasto. Isso destrói a vegetação original, empobrece o solo e elimina a biodiversidade local.
Por fim, a economia baseada na economia agroexportadora concentra investimentos e renda no meio rural, mas isso não necessariamente ajuda a desenvolver a indústria e diversificar serviços. Portanto, a riqueza gerada pode acabar concentrada nas mãos dos grandes proprietários rurais.

Histórico da estrutura fundiária brasileira
A concentração de terras é uma característica da estrutura fundiária brasileira desde o início do processo de colonização e permanece até hoje.
- Início da colonização (século XVI): Brasil foi dividido em Sesmarias e Capitanias Hereditárias, ambas divisões de grandes pedaços de terra para poucos proprietários;
- Ciclo do açúcar (1530 a 1650): implantação dos engenhos de cana-de-açúcar no Nordeste, estruturando a terra em grandes propriedades monocultoras e exportadoras de açúcar para a Europa;
- Ciclo do café (século XIX e início do século XX): consolidação das grandes propriedades voltadas ao café principalmente na região Sudeste brasileira;
- Revolução Verde (1970): também chamada de "modernização conservadora", pois trouxe tecnologia, mecanização, sementes geneticamente modificadas, porém manteve a estrutura fundiária concentrada;
- Agronegócio e expansão da fronteira agrícola (século XXI): a expansão do agronegócio e a sua modernização intensificou a concentração de terras e a desigualdade no campo, além de expandir a fronteira agrícola para áreas como a Amazônia e o Matopiba.
Outro ponto importante no histórico da estrutura fundiária brasileira é a Lei de Terras de 1850. A Lei determinava que somente quem pudesse pagar por terras devolutas (sem dono legal) teria acesso a elas. Antes dessa lei qualquer pessoa que ocupasse a terra seria dona dela.
Assim, a Lei de Terras torna a terra uma mercadoria que pode ser comprada e vendida, transformando a forma do acesso à terra segundo a lógica capitalista.
A Lei ajudou a consolidar o latifúndio, aumentou a concentração de terras e excluiu as populações mais pobres (indígenas, ex-escravizados, imigrantes) do acesso à terra.
O Movimento dos Sem Terra
Ao longo dos séculos a estrutura fundiária brasileira se manteve concentrada e desigual. No final dos anos 1970 a mecanização do campo e a concentração de terras expulsavam milhares de trabalhadores rurais.
No Sul do país começam a surgir ocupações de terra espontâneas, organizando acampamentos e cobrando a reforma agrária.
Em 1984, no Paraná, surge oficialmente o Movimento dos Sem Terra (MST). É um movimento que reivindica a transformação da estrutura fundiária brasileira através da reforma agrária, da utilização social de terras improdutivas e do direito ao trabalho e à produção de alimento.
Para praticar: Exercícios sobre estrutura fundiária no Brasil (com gabarito explicado)
Referências Bibliográficas
COMISSÃO PASTORAL DA TERRA (CPT). Dados de conflitos no campo em 2024 registram diminuição no número de conflitos, mas não da violência. Release Geral. Brasília: CPT, 23 abr. 2025. Disponível em: https://www.cptnacional.org.br/wp-content/uploads/2025/04/RELEASE-GERAL-Dados-de-conflitos-no-campo-em-2024-registram-diminuicao-no-numero-de-conflitos-mas-nao-da-violencia-.pdf. Acesso em: 21 nov. 2025.
COMISSÃO PASTORAL DA TERRA – Nordeste II. MS e MT lideram ranking nacional em concentração de terra. Recife, 31 ago. 2025. Disponível em: https://cptne2.org.br/noticias/7-campanha-pelo-limite/2577-ms-e-mt-lideram-ranking-nacional-em-concentracao-de-terra. Acesso em: 21 nov. 2025.
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SCOFANO, Amanda. Estrutura fundiária: o que é, características e exemplos no Brasil. Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/estrutura-fundiaria-o-que-e-caracteristicas-e-exemplos-no-brasil/. Acesso em: