Exercícios sobre estilística (com questões explicadas)
Teste seus conhecimentos sobre estilística com os exercícios abaixo. Confira as respostas e tire suas dúvidas no gabarito explicado.
Questão 1
Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.
Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.
E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.
— Eu faço versos como quem morre.
BANDEIRA, M., A Cinza das Horas, Teresópolis, 1917.
Neste poema, o eu lírico expressa a criação poética como uma experiência de intensa dor, em que o ato de escrever se confunde com o sofrer e até com a morte. A construção estilística dessa ideia é realizada com base em recursos expressivos característicos da linguagem literária. O recurso que melhor representa essa fusão entre sentimento e palavra é:
a) eufemismo, ao suavizar a ideia de morte com imagens sensoriais.
b) hipérbato, ao modificar a ordem direta das orações para causar estranhamento.
c) paradoxo, ao apresentar a poesia como uma forma de morrer.
d) metáfora, ao representar o verso como sangue que escorre, comparando a criação poética a um ato visceral e doloroso.
e) antítese, ao opor a vida à arte como caminhos distintos.
Alternativa certa: d) metáfora, ao representar o verso como sangue que escorre, comparando a criação poética a um ato visceral e doloroso.
Dentre as figuras de linguagem presentes no poema, aquela que representa de forma mais clara o ato de escrever com o sofrimento é a metáfora, que compara, de forma implícita, palavras com significados diferentes, como verso e sangue em Meu verso é sangue.
Ainda que haja outras figuras no poema, como é o caso da comparação presente no primeiro verso (Eu faço versos como quem chora), as alternativas restantes apresentam figuras não pertinentes ao texto.
Questão 2
Chove lá fora e aqui dentro também. Mas a chuva daqui não molha a roupa, não escorre na janela. Ela pesa nos ombros, embacia o olhar, sussurra ausências. Enquanto a cidade corre, molhada de pressa, eu fico. Estancado, feito poça esquecida na esquina. Esperando alguém passar e notar que ainda estou aqui — inteiro e alagado.
A linguagem figurada presente no texto serve para
a) estabelecer uma crítica ao abandono emocional da vida urbana.
b) retratar a experiência subjetiva de um estado emocional.
c) sugerir o impacto ambiental das chuvas nas cidades.
d) dramatizar a relação entre a solidão e o tempo.
e) metaforizar o luto por meio da paisagem atmosférica.
Alternativa certa: b) retratar a experiência subjetiva de um estado emocional.
O texto constrói uma analogia entre a chuva externa (real) e uma chuva interna (simbólica), que representa sentimentos como tristeza, solidão e abandono. A linguagem figurada aparece em expressões como “a chuva daqui não molha a roupa” e “ela pesa nos ombros, embacia o olhar, sussurra ausências”, que não descrevem um fenômeno climático real, mas sim sensações íntimas.
O narrador associa seu estado emocional à imagem de uma poça d’água esquecida, sugerindo imersão na dor ou no vazio, num tom introspectivo. Assim, o uso da metáfora da chuva tem como função expressar subjetivamente um estado afetivo — não denunciar problemas sociais, nem falar do clima literal, nem metaforizar o luto de forma direta.
Questão 3
Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos
A Lua, tal qual a dona do bordel
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel
(...)
A esperança dança
Na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha
Pode se machucar (...)”
Trecho da canção “O Bêbado e a Equilibrista”, de João Bosco e Aldir Blanc.
A letra da canção constrói imagens poéticas carregadas de crítica social e emoção, com elementos que traduzem os sentimentos do Brasil no período da Anistia. Um dos recursos expressivos mais marcantes da canção está na associação da esperança à figura da equilibrista. Tal efeito estilístico é alcançado com o uso de:
a) assonância, ao repetir sons vocálicos em palavras marcantes como viaduto e luto.
b) ironia, ao sugerir leveza em meio a uma situação trágica.
c) sinestesia, ao articular emoção e percepção visual.
d) prosopopeia, ao atribuir à esperança ações humanas.
e) antítese, ao opor esperança e sofrimento em versos alternados.
Alternativa certa: d) prosopopeia, ao atribuir à esperança ações humanas.
A imagem da esperança dançando na corda bamba de sombrinha configura uma personificação (ou prosopopeia), pois atribui à esperança um comportamento humano (a esperança dança e pode se machucar).
Questão 4
— Vai sair assim?
— Assim como?
— Com essa cara de quem sonhou demais.
— E como é que sonha de menos?
— Dormindo com a alma fechada, talvez.
A conversa parou ali. Mas a pergunta ficou no ar, pairando entre as roupas, o espelho e o dia que começava.
Nesse diálogo, a construção do sentido depende da
a) valorização da linguagem poética como forma de resistência.
b) elaboração de uma crítica social à repressão dos desejos.
c) ambiguidade da linguagem e dos sentidos provocados.
d) oposição entre sonho e realidade no plano político.
e) análise lógica dos conceitos de identidade e liberdade.
Alternativa certa: c) ambiguidade da linguagem e dos sentidos provocados.
O diálogo trabalha com ambiguidades e subentendidos, especialmente na metáfora “cara de quem sonhou demais”, que sugere uma visão poética sobre o conflito entre sonhar e se conformar.
Questão 5
Ela chegou cheirando o brilho do verão nos olhos. Quando falou, sua voz cheirava à tarde de janeiro. Eu, que era só inverno, toquei-a com meus aromas e ela derreteu.
A construção do texto baseia-se em uma linguagem em que a sensorialidade cumpre papel central. A figura de linguagem responsável por associar diferentes sensações aos órgãos de sentidos é denominada:
a) metáfora.
b) sinestesia.
c) hipérbole.
d) metonímia.
e) antítese.
Alternativa certa: b) sinestesia.
A sinestesia ocorre quando há a associação de sensações de diferentes sentidos: cheirando o brilho, voz cheirava, toquei-a com meus aromas.
Questão 6
O professor paciente avisou os alunos atrasados que a difícil prova começaria em cinco minutos.
A linguagem cotidiana frequentemente busca conciliar objetividade e clareza, especialmente em contextos informativos, como o de avisos e comunicações escolares. No entanto, determinadas construções sintáticas podem comprometer o entendimento da mensagem ao permitir múltiplas interpretações. Isso evidencia um desvio em relação a um estilo claro e funcional, esperado em situações comunicativas desse tipo.
No caso do texto apresentado, o efeito de sentido prejudicado decorre de um vício de linguagem conhecido como:
a) preciosismo, pelo uso de vocabulário excessivamente erudito e artificial.
b) plebeísmo, pela utilização de expressões de baixo nível linguístico.
c) cacofonia, pela combinação de palavras com som desagradável.
d) ambiguidade, pela estrutura que permite mais de uma leitura possível.
e) barbarismo, pela utilização de vocábulos usados incorretamente em termos de significado.
Alternativa certa: d) ambiguidade, pela estrutura que permite mais de uma leitura possível.
O trecho apresenta ambiguidade, pois não se sabe se todos os alunos estavam atrasados ou apenas os alunos que estavam atrasados foram avisados. Isso compromete a clareza da mensagem e viola o princípio de um estilo informativo direto e eficiente, típico da linguagem funcional.
Questão 7
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.
(...)
Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.
(Carlos Drummond de Andrade. “Infância”)
No poema, o eu lírico reconstrói a infância a partir da memória, revivendo imagens do cotidiano familiar com simplicidade e afeição. Essa evocação, feita com estilo intimista e tom nostálgico, revela a tensão entre a distância temporal e a vivacidade da lembrança, criando um efeito expressivo marcado por:
a) antítese, ao opor o passado ao presente da narração.
b) eufemismo, ao suavizar o distanciamento familiar.
c) paradoxo, ao trazer à presença um tempo que já passou, como se a infância pudesse ser vivida novamente.
d) metonímia, ao usar a figura do pai como representação da família.
e) hipérbole, ao exagerar a importância da história pessoal frente à de Robinson Crusoé.
Alternativa certa: c) paradoxo, ao trazer à presença um tempo que já passou, como se a infância pudesse ser vivida novamente.
O paradoxo está presente na convivência de duas ideias aparentemente contraditórias: a infância como algo irrecuperável e, ao mesmo tempo, vivida novamente por meio da memória.
O eu lírico “não sabia” que sua história era mais bonita, mas hoje a revive com intensidade - essa contradição revela o poder evocativo da lembrança.
Veja também: Exercícios de figuras de linguagem com gabarito
FERNANDES, Márcia. Exercícios sobre estilística (com questões explicadas). Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/exercicios-sobre-estilistica-com-questoes-explicadas/. Acesso em: