Lei da Anistia

Juliana Bezerra
Juliana Bezerra
Professora de História

Anistia é o ato jurídico em que crimes políticos cometidos dentro de um determinado período de tempo são esquecidos.

No Brasil, a Lei de Anistia de 1979, permitiu o retorno de todos os acusados de crimes políticos no período do regime militar.

Significado

A palavra anistia vem do grego “amnestia” e significa esquecimento. Não por acaso tem a mesma raiz etimológica de amnésia.

Juridicamente, anistia é o perdão concedido pelo Poder Legislativo a crimes que são considerados de natureza política. Igualmente, os processos que investigavam esses atos deixam de existir. Quem é beneficiado por ações e anistia não responde novamente pelo ato cometido. É como se ele deixasse de existir.

A Lei da Anistia foi sancionada pelo presidente o general João Batista Figueiredo, em 28 de agosto de 1979, após intensas lutas da sociedade civil.

Brasil

A luta pela anistia no Brasil se inicia tão logo houve a cassação de direitos políticos a parlamentares por 10 anos em 1964.

No entanto, com o AI-5, esta reivindicação se intensifica porque este decreto foi muito mais abrangente. Desta forma, em 1971, um grupo de parlamentares do MDB acrescenta o pedido de anistia num documento do partido chamado “Carta do Recife”.

O governo tratava as denúncias de tortura e maus-tratos como uma campanha difamatória e tentava silenciar estas vozes.

Em 1973, porém, durante a eleição presidencial indireta, o candidato da oposição Ulysses Guimarães faz um discurso demandando a anistia.

Igualmente, as mulheres se juntaram a esta luta com a criação do Movimento Feminino pela Anistia (MFPA), em 1975. Esta ação é importante dentro do quadro do Feminismo no Brasil.

Anistia
Passeata pela anistia pelo centro do Rio de Janeiro

O Manifesto lançado por esta organização conseguiu 16 mil assinaturas em todo país. Em seguida, entidades civis como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) passam a apoiar abertamente à anistia.

Do mesmo modo, o modelo econômico praticado pelos militares se esgotava e a população começa a se organizar em tornos de associações como o Movimento contra a Carestia de Vida, dentre outros.

Durante o governo Geisel (1974-1979) houve uma tímida abertura política com a revogação do AI-5. A morte do jornalista Vladimir Herzog foi um revés ao governo, pois a União foi responsabilizada pelo seu falecimento.

Ao passar a faixa para seu sucessor, João Baptista Figueiredo (1918-1999), este continuou com a política de abertura de Geisel (1907-1996).

No entanto, esta deveria ser controlada pelos militares e seus aliados civis, deixando pouca margem de manobra para a oposição.

Cada vez mais ganhava a ideia de que a Anistia deveria ser “ampla, geral e irrestrita”, ou seja, contemplar todos aqueles que praticaram atos em nome da luta contra a ditadura.

Para chamar ainda mais a atenção da mídia, um grupo de prisioneiros políticos encarcerados no Rio de Janeiro, começa uma greve de fome em 22 de julho.

Os grevistas recebem a visita do senador Petrônio Portela (Arena-AL) que fazia parte da Comissão Mista que analisava um projeto de lei para a anistia.

Anistia
Presos políticos que realizavam uma greve de fome pela anistia

Votação

Numa sessão de oito horas no Congresso dos Deputados, com discursos exaltados e soldados a paisana nas galerias, os parlamentares aprovam a lei da Anistia.

Assim, em 28 de agosto de 1979, o presidente Figueiredo sanciona a lei. Com isto, políticos e intelectuais exilados puderam voltar ao país e profissionais puderam reaver seus postos de trabalho.

A lei contemplou os crimes cometidos no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979. Ela garantia retorno dos exilados ao país; restabelecimento dos direitos políticos suspensos de servidores da administração direta e indireta; dos servidores do Legislativo e do Judiciário; de fundações ligadas ao poder público.

Também estendia esses benefícios aos militares envolvidos em crimes cometidos contra aqueles que foram detidos.

Na Lei de Anistia não foram contemplados com a anistia aqueles condenados por crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado. Esses processos seguiram seu curso normal.

A anistia beneficiou imediatamente 100 presos políticos e 150 banidos. Cerca de 2000 brasileiros puderam voltar ao país e dentre as pessoas que voltaram rapidamente podemos citar: Fernando Gabeira, Hebert de Souza, o Betinho; Leonel Brizola, Luís Carlos Prestes, Márcio Moreira Alves, Miguel Arraes, Francisco Julião.

Comissão da Anistia

A Comissão de Anistia foi criada em 2002 para a reparação de crimes e violações aos Direitos Humanos cometidos no Brasil entre 1946 e 1988.

Até 2017, a Comissão recebeu 75 mil pedidos de ressarcimento, econômico ou moral. Do total, 63 mil foram julgados e 40,3 mil foram deferidos. Ainda há 10 mil processos aguardando julgamento.

Nem sempre se trata de obter alguma compensação econômica e sim de pedir o reconhecimento da condição de anistiado político e receber um pedido oficial de desculpas.

Anistia Internacional

A Anistia Internacional é uma organização fundada em 1961 que luta contra as prisões arbitrárias, tráfico de pessoas e qualquer tipo de violência do Estado aos cidadãos.

No Brasil, em 1972, em peno governo do general Emílio Médici (1970-1974), a instituição lançou um relatório onde denunciava a tortura no país.

A repercussão internacional foi tão grande que os jornais brasileiros foram proibidos de mencionar o nome da Anistia Internacional em suas publicações.

Três anos depois, a Anistia Internacional escolhe o preso brasileiro César Benjamin, estudante menor de idade, como "preso de consciência" daquele ano.

Isto significava que ele se tornaria o símbolo de todos aqueles que passavam pela mesma situação. Desta maneira, a pressão sobre o governo brasileiro, pela sua soltura, aumentava.

Graças ao esforço de advogados e jornalistas da Anistia Internacional, César Benjamin foi solto em 1976 e no dia seguinte expulso do país. Ele se dirigiu à Suécia onde os membros da Anistia haviam conseguido asilo político para ele.

A Anistia Internacional continua lutando para que os responsáveis pelos crimes cometidos por militares e agentes do Estado no Brasil sejam punidos.

Curiosidade

O lema da campanha pela anistia era "Ampla, Geral e Irrestrita" e foi cunhado em 1978 pelo jurista Aloysio Tavares Picanço (1922-2015) quando votou a favor do parecer elaborado pela OAB pela anistia política. Rapidamente, a expressão ganhou as ruas, cartazes e faixas.

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Juliana Bezerra
Juliana Bezerra
Bacharelada e Licenciada em História, pela PUC-RJ. Especialista em Relações Internacionais, pelo Unilasalle-RJ. Mestre em História da América Latina e União Europeia pela Universidade de Alcalá, Espanha.